Já está pronto o quinto livro de poesias do historiador e escritor Aristides Arthur Soffiati. O título, “Intervalo”, sugere uma pausa para um passo adiante, que pode vir com uma obra reunindo textos escritos na década de 1970. Devido à pandemia da Covid-19, ainda não há previsão para lançamento físico, o que se estende a dois novos livros de Soffiati voltados à história ambiental: “O dourado e a piabanha”, sobre a atividade pesqueira, e “De Barra a Barra”, mergulhando na zona costeira de Campos. Ambos também já estão concluídos.
— Não estou acostumado a lançamentos virtuais. Prefiro esperar a vacina ou o recuo da pandemia — disse o autor.
A produção poética de Soffiati segue uma espécie de roteiro. Apesar de escrever poesias desde 1965, ele só foi lançar o seu primeiro livro do gênero em 1990. Patrocinado pela Folha, “Depois do princípio e antes do fim” aborda a temática ambiental, com textos funcionando como um manifesto pela ecopoesia. Ali já era possível identificar um traço que viria a ser marcante em obras do escritor: a diluição do “eu”.
— Pode-se dizer que não há novidade nisso. Geralmente, os poetas românticos, parnasianos e simbolistas não usavam o pronome pessoal “eu”. Mas, a subjetividade está presente. É perfeitamente possível distinguir a dicção romântica de uma dicção parnasiana. A dissolução do “eu” de que falo é a que propõe João Cabral de Melo Neto. Mesmo assim, o “eu” não desaparece nos seus poemas. A gente reconhece um poema dele. Manoel de Barros, em outro sentido, também busca a dissolução do “eu” nas plantas, pedras, na água. Então, o que busco parece ser inalcançável: um poema sem poeta — afirmou Soffiati, que se auto-identifica como um poeta que conhece outros poetas para escrever poesia.
O meio ambiente também está presente no segundo livro de poesias do autor, “O direito e o avesso do mangue”, publicado em 1999. O terceiro só sairia mais de uma década depois. Em “Mínima Poética”, de 2011, Soffiati consolidou a “tática” de se ocultar nos textos de forma a reduzi-los. Algo totalmente inverso do que seria feito em “Todavia”, de 2014, com foco no resgate do passado. “Trilhei várias vias e entendi que não cabia jogar tudo fora. O ‘eu’ explícito aflora novamente. Chego mesmo a escrever um soneto inspirado pelo trabalho de uma enfermeira enquanto estava internado. Misturo línguas, escrevo para cachorros, gatos e netos”, relatou.
Eis que a produção poética foi retomada agora, com “Intervalo”, despertando novas influências percebidas pelo autor.
— Uma amiga do Paraná leu os poemas para me ajudar na sua publicação. Ela leu os poemas em voz alta, mas a minha poesia nunca pretendeu ser oral. Ela não foi escrita para ser declamada, e sim para ser vista. Agora, além de João Cabral, descubro que também fui influenciado por mais três poetas: José Paulo Paes, Paulo Leminski e Paulo Henriques Britto. Este último faz a mesma busca que eu: dar sumiço no “eu” poético. Ele diz que, depois de João Cabral, escrever poesia se tornou muito difícil. Entende que não se pode deixar as palavras soltas, como fizeram os modernistas da primeira geração. Que é preciso domesticá-las — explicou Soffiati, enfatizando características como os poemas curtos, com versos metrificados e rimas inusitadas, suficientes para expressarem uma visão de mundo: — Paulo Henriques não escreve poemas. Ele constrói poemas. Escrever de acordo com as emoções, sem o compromisso da metrificação e da rima, é prazeroso, mas domesticar palavra é muito difícil. Creio ter facilidade para a prosa não ficcional, mas tenho muita dificuldade de construir poemas. Não consigo mais escrever de acordo com o coração. Minha poesia é cerebral, tem de ser construída. E a construção cansa.
Daí a possibilidade de publicar posteriormente um livro com textos do início de sua trajetória como poeta. Como ainda não tem certeza sobre a realização do projeto, Soffiati não crava se “Intervalo” é a sua último ou penúltima obra com caráter poético:
— Já tenho alguns poemas escritos. Reconheço que nunca fui inspirado no ato de escrever poesia. Mais que inspiração, existe em mim muita transpiração, como dizia Drummond. Nem mesmo sei se conseguirei lançar esse sexto livro. Há sempre o pessoal do “deixa disso”. Dizem que escrevo bem, mas acho que nunca leram nada do que compus. Como tenho pelo menos um livro inédito, escrito em 1971, com poemas visuais muito influenciados pelo movimento do poema processo, algumas pessoas mais chegadas a mim insistem para que ele seja publicado. Sugerem-me também uma antologia e a reunião dos meus livros num só. Seriam os poemas completos. Acho tudo um exagero.