Cinema: Esqueleto-mede-palmo
* Arthur Soffiati - Atualizado em 27/10/2020 14:00
Suponho que o leitor conheça a lagarta chamada mede-palmo por se locomover como uma mão que mede o espaço: a parte de trás dela se desloca para a frente quase a alcançando. Ela é um dos estágios da metamorfose de um inseto. Mas, isso nada tem a ver com o filme “O horror vem do espaço”, dirigido em 1958 pelo cineasta inglês Arthur Crabtree. O título original é “Fiend without a face”. Ao pé da letra, significa “Demônio sem rosto”. A tradução de títulos no Brasil, como acontece muitas vezes, foge completamente do sentido original.
Em “O horror vem do espaço”, o horror não vem do espaço, mas da Terra mesmo. Ele se origina na ciência, um dos medos que marcaram a década de 1950, ao lado de uma nova guerra nuclear. Aqui, a energia nuclear aparece no seu uso cotidiano combinado com poderes mentais de um cientista.
Pra variar, trata-se de um filme de baixo orçamento que tangencia o “trash”. Numa cidade do interior, foi construída uma base aérea em que se emprega a energia nuclear. Esse é um traço característico de muitos filmes da época. As coisas misteriosas e perigosas acontecem no interior. Não nas metrópoles.
E coisas estranhas acontecem. Pessoas desaparecem. Delas, só se ouvem os gritos no início do filme. Depois, aparecem pessoas que são mortas por uma força invisível. A produção está economizando orçamento com esses truques fáceis. Deixemos os efeitos visuais mais caros para o final.
Mas, quem está matando pessoas? Acredita-se que seja radiação proveniente da base militar. O comandante se apressa em desmentir boatos. No entanto, um militar não afasta a possibilidade. Ele acaba encontrando uma mocinha moradora na cidade. Bárbara (Kim Parker) é a típica jovem da época: bonitinha, busto empinado artificialmente, cintura afinada por cinto apertado (talvez espartilho) e saia plissada. Por mais que o seu comportamento seja liberal, ela sente medo, dá gritinhos e pede proteção do militar viril. Logo de início, antecipa-se o encontro amoroso dos dois no final.
Também não é estranho a filmes de ficção científica dessa época encontrar um médico ou um cientista conceituado. Os cientistas, geralmente, refugiam-se no interior para desenvolverem as suas estranhas pesquisas sem serem incomodados. O cientista de “O horror vem do espaço” desenvolve a força da mente. Ele lida mais com parapsicologia do que com tubos de ensaio.
As investigações acabam revelando que a radioatividade da base militar combinada com as experiências do cientista criaram um poder assassino. Ele suga o cérebro das vítimas e se apodera do esqueleto craniano e da coluna vertebral. Chega o momento em que não é mais possível economizar nos efeitos especiais.
A casa da mocinha, então, é cercada por crânios com colunas vertebrais semelhantes a lagartas mede-palmos. Eles voam e atacam as pessoas. Muitas são abatidas por tiros dos militares. A base militar precisa ser desativada. Sem o cientista e a base, os crânios sucumbem. Foi preciso recorrer ao stop-motion, mas de forma sofrível.
Arthur Crabtree é uma daquelas figuras que fez de tudo no cinema. Começou como diretor em 1945. Seu trabalho mais conhecido é “Ivanhoé”, série de televisão de 1956, lançando Roger Moore, um dos agentes 007. “O horror vem do espaço” é um dos seus últimos filmes. O cinema foi construído por pessoas como ele. Os grandes diretores, roteiristas e artistas escoram-se em pessoas como ele. Daí a homenagem que lhe faço.

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