Cinema: Atual e oportuno
Felipe Fernandes - Atualizado em 20/10/2020 12:51
Filme
Filme "Os 7 de Chicago" / Divulgação
“Os 7 de Chicago” — É um drama histórico de tribunal com viés político, que relembra um dos julgamentos mais famosos da década de 1960 no Estados Unidos e, não por acaso, chega ao streaming (Netflix) em um momento bem oportuno, às vésperas da eleição presidencial norte-americana.
A história se passa em 1968, quando diferentes grupos contrários à guerra do Vietnã se uniram em um grande protesto, que aconteceu em Chicago, no mesmo dia da Convenção Nacional Democrata. Após a situação terminar em um grande conflito entre manifestantes e policiais, com vários feridos, oito pessoas (que posteriormente se tornaram sete) foram presas e indiciadas por conspiração.
O histórico julgamento é retratado em um filme de elenco estelar, comandado por Aaron Sorkin (“A rede social”), o aclamado roteirista que dirige seu segundo filme e tem o ritmo acelerado e o excesso de diálogos como principais características, o que pode incomodar alguns espectadores, mas se tornam qualidades na mão de um artista seguro do seu estilo.
O filme abre com uma introdução muito ágil, que, com uma montagem inteligente, costura as principais características dos indiciados, introduzindo cada um dos personagens, suas ideologias, explicando a instabilidade social do período e montando um mosaico da diversidade dos integrantes do improvável grupo que será levado a julgamento.
Sorkin é inteligente ao levar o filme direto para o julgamento, montando uma estrutura narrativa que permite ao filme flashbacks pontuais para revelar importantes informações nos momentos certos, além de tirar a história do tribunal, criando um dinamismo que torna a experiência bem agradável.
Apesar dos muitos diálogos e do ritmo acelerado, o filme nunca se torna de difícil compreensão, mantendo o discurso político em primeiro plano, sem soar demasiadamente panfletário. Sorkin ainda faz uso do humor para criar personagens carismáticos e trabalha com brilhantismo as complexas relações dentro do grupo, conseguindo criar uma sensação de coesão, ao mesmo tempo em que deixa claras as divergências de ideologias e linhas de pensamento.
Tanto o carisma dos personagens quanto a química do grupo funcionam muito pela qualidade do elenco, um cast inspirado que reúne diversos nomes famosos. Em alguns casos, as características dos personagens funcionam devido à escolha dos atores.
Um destes casos é o do promotor interpretado pelo excelente Joseph Gordon Levitt (“Batman: O cavaleiro das trevas ressurge”). O bom mocismo inerente ao ator contribui muito para a imagem que temos do personagem, deixando o posto de antagonista exclusivamente para o controverso juiz Hoffman, em uma grande atuação de Frank Langella (“Frost/Nixon”). Mas, é inegável que o texto de Sorkin pesa a mão com o personagem em diversos momentos.
Destaque para Sacha Baron Cohen (“Borat”), que encontra o ponto certo entre o humor e o drama em um personagem que poderia facilmente se tornar uma caricatura, e para o inspirado Mark Rylance (“Ponte de espiões”), que constrói a força de seu personagem nas sutilezas e na fala mansa do ator, que cresce em momentos chave.
O ponto fraco do filme fica no “abandono do oitavo membro”. É dado um grande destaque a Bobby Sale, interpretado com muita competência por Yahya Abdul-Mateen II (“Watchmen”). Mas, em determinado momento, o personagem é simplesmente abandonado (muito em função do andamento da história, é verdade, afinal se trata de uma história real), excluindo da história um elemento importante que vinha tendo grande destaque desde a introdução. Isso acaba criando uma frustração, por ter um desfecho tão incompatível com o restante do longa.
“Os 7 de Chicago” reconta um julgamento de quase 50 anos que ecoa nos dias atuais e prova o quanto ainda estamos próximos de problemas sociais, políticos e democráticos, que estão presentes não só nos Estados Unidos, mas em diversas partes do mundo. A poderosa cena final e as questões levantadas provocam a reflexão de como somos ultrapassados como sociedade; problemas antigos que se repetem e não diferem fronteiras nem culturas.

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