Arthur Soffiati: As cinco pandemias da humanidade (II)
Arthur Soffiati 18/09/2020 15:21 - Atualizado em 18/09/2020 15:22
Enquanto a maioria das pessoas conhece, ainda que superficialmente, a Peste Negra e sua devastação na Europa, poucos ouviram ou leram sobre a Peste Justiniana ou sobre a Terceira Pandemia de peste bubônica, no século XIX. Esta começou na fronteira do Tibete com a China e se espalhou lentamente até Hong Kong, onde chegou em 1894, e daí se alastrou para todos os portos do mundo pelos navios a vapor. A pandemia atingiu principalmente Índia e China; Austrália, Escócia, Brasil e EUA. Nestes dois últimos países, os surtos foram locais e logo contidos.
Supõe-se que a origem dela se localize na província chinesa de Yunnan, começando em 1855. A disseminação das doenças transmissíveis ainda era lenta nessa época. O agente de transmissão viajava de navio para alcançar o mundo. Curiosamente, a Terceira Pandemia não entrou na Europa. Ressalte-se que os tempos eram outros. Pasteur já havia descoberto os micróbios. Entre aqueles que estudaram com ele, estava o cientista franco-suíço Alexander Yersin, que identificou a bactéria causadora da Peste Negra em Hong-Kong no ano de 1894. Em sua homenagem, ela recebeu o nome científico de “Yersinia pestis”. Os responsáveis por uma doença que matou tantas pessoas e exerceu imenso terror não eram mais os judeus, as feiticeiras, os gatos etc. Era um ser vivo microscópico.
Definiu-se o tripé em que se sustentava a peste bubônica: bacilo causador, rato preto hospedeiro e pulga vetor. Como os ratos e outros roedores também morriam, entendeu-se que a alta mortalidade deles obrigava as pulgas a buscarem novos corpos para se alimentarem, passando a picar pessoas e animais domésticos. Matar ratos para combater a doença liberava as pulgas para atacarem humanos mais rapidamente. As pesquisas mostraram que a bactéria causadora inibe seletivamente a resposta imune inata, que é a primeira linha de defesa do organismo. Algo como um ladrão desligando o controle de luz de uma casa para melhor trabalhar.
Seguindo de perto os livros “O enigma da Peste Negra”, de Fernando Portela Câmara (Rio de Janeiro: E-papers, 2015), e “A história e suas epidemias”, de Stefan Cunha Ujvari (Rio de Janeiro/São Paulo: Senac, 2003), assustamo-nos com a forma implacável de morte causada pela bactéria. “O hálito, os vômitos, as fezes e a urina desses doentes têm um odor intensamente pútrido. É frequente, nesses casos, a gangrena de extremidades (dedos dos pés e das mãos, podendo se estender, algumas vezes, para os testículos e a ponta do nariz) e órgãos internos (baço, fígado, pulmões, ponta do coração, rins, intestinos)”. Assim Câmara resume suas manifestações.
Contribuíram para a disseminação da peste a guerra civil chinesa e a construção de ferroviais nas planícies geladas da Manchúria até a Rússia. Houve perturbação na ecologia dos gerbilos (ratos-do-deserto) e marmotas, intensificando seu contato com populações de trabalhadores, militares e refugiados. A exportação de peles de marmota a partir de 1908 também contribuiu para a propagação da doença. Em 1910, caçadores mongóis e membros da tribo Buriat perceberam uma mortandade de marmotas no campo e fugiram. Era uma forma pragmática antiga de detectar a epidemia.
Existe uma corrente de pesquisadores que associa os surtos de peste bubônica a mudanças climáticas. Ocorreu um resfriamento natural no século VI d.C., provocando um colapso na agricultura e atingindo o império romano em cheio. Na mesma época, ocorre a Peste Justiniana. Da mesma forma, houve um forte resfriamento natural no século XIV, depois de um breve aquecimento global natural. Ao mesmo tempo, alastrou-se a Peste Negra. A forte explosão do vulcão Krakatoa, na Indonésia, em 1887-88, não apenas detonou completamente a ilha em que se situava, como a poeira lançada na atmosfera envolveu o mundo todo e bloqueou parcialmente a radiação solar. Com isso, ocorreu um resfriamento natural que deve ter contribuído para a pandemia.
Desde a revolução industrial do final do século XVIII, emanações gasosas, principalmente de gás carbônico, estão mudando a composição da atmosfera. Atualmente, as mudanças climáticas produzidas por atividades humanas tornam-se cada vez mais acentuadas. Tempestades devastadoras, secas inclementes, ventos fortes, aumento da temperatura média global podem contribuir para novas ondas epidêmicas e pandêmicas. As epidemias de peste bubônica costumavam acontecer depois de chuvas intensas que causavam o crescimento da vegetação consumida por roedores. Já se pode estabelecer uma relação entre chuvas intensas e a propagação da dengue, da malária e de outras doenças transmitidas por vetores.
Sendo causada por uma bactéria, a peste bubônica pode atualmente ser combatida com antibióticos. Mas o tratamento deve começar logo aos primeiros sinais, pois ela progride em poucos dias, levando à morte.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

    BLOGS - MAIS LIDAS

    Mais lidas
    Suspeito de estuprar uma mulher é preso em flagrante em Itaperuna

    De acordo com a PM, a vítima foi encontrada nua e pedindo socorro em uma rua da cidade

    Nova gestão do Americano demite técnico Marcelinho Paraíba e dispensa 10 jogadores

    Técnico foi apresentado na semana passada, no dia 25 e não chegou nem a estrear

    Americano: Tolentino Reis é destituído em Assembleia Geral Extraordinária realizada nesta segunda

    De acordo com a decisão da Assembleia, Laila Póvoa, vice-presidente, assume a presidência do clube, embora a confirmação burocrática ainda dependa de formalidades

    Prumo, Porto do Açu e Ferroport lançam Programa de Estágio 2025 com vagas em São João da Barra

    As inscrições podem ser feitas até 25 de abril.; Entre os benefícios disponíveis estão bolsa auxílio competitiva, vale refeição, vale transporte, entre outros

    Carreta atinge poste ao invadir Calçadão do Centro de Campos

    Segundo testemunhas, alguns pontos do centro estão sem luz já que o veículo também atingiu fios do local