Nelson Rodrigues nasceu no Recife, em 1912, e morreu em 1980. Ainda criança, muda-se para o Rio de Janeiro, filho de um jornalista de nome Mário, de família numerosa: 14 filhos. Foi educado de várias maneiras na escola, onde, aos seis anos, quase mata a professora de susto, ao dar para ela ler uma composição sua: “o marido mata a esposa a facada e depois chora arrependido”.
Começa aos 13 anos a trabalhar como repórter no jornal do pai, com funções e obrigações rígidas, na seção policial. Sua imaginação delirante se esbaldava. Não só escrevia longamente sobre o tema, como, em certos casos, ia até o local do crime para ver in loco como tudo tinha acontecido. O ambiente era tenso e frenético. Assim, mais tarde as suas peças. O pai vivia às voltas com a censura. Nelson, autor teatral, esbarraria no mesmo problema. Moralista convicto, estava sempre com prostitutas. O claro-escuro e a paranoia são o chão de Nelson Rodrigues. Criador de contrastes.
Em período de dificuldade financeira, decide casar-se com uma colega do jornal “O Globo”. Ao passar pelo teatro Rival, viu uma enorme fila e foi ver o que era. Estava em cartaz uma peça de Raimundo Magalhães Junior, chamada “A família Lero-Lero”. Ouviu alguém comentar: — Esta chanchada esta rendendo os “tubos”. Por que não escrever para teatro, e assim aumentar a renda?!
Sua primeira peça, “Mulher sem pecado” em 1942. Um ano e meio depois de escrita, a peça foi montada. Não teve a menor projeção, não se falava dela, os críticos detestaram. Nelson já tinha outro projeto em mente. Na noite da estreia de “Mulher sem Pecado”, depois da coalhada na confeitaria Palmira, ao lado da mulher Elza, que notou que ele estava muito calado, já no bonde, ele pensou: “Véu de Noiva”. Mas, logo em seguida, encontro outro melhor, “Vestido de Noiva”. Nelson começou a escrever a peça na redação de “O Globo”, levou um pito de um superior e passou a escrevê-la em casa. Levou seis dias para terminar essa obra-prima. As personagens literalmente saltavam de seus dedos enlouquecidos: Alaíde, Lúcia, Pedro e Madame Clessy. Seis dias.
Começou a guerra para que a lessem, mandou uma cópia para Manuel Bandeira, que leu e gostou. Depois de passar pela mão das pessoas mais influentes, a peça chegou às mão de Santa Rosa e Brutos Pedreira, que não queriam acreditar no que estavam lendo. O polonês Ziembinski, que já lia português, disse. “Não conheço nada no teatro mundial que se pareça com isso”. E, depois de oito meses de ensaio a alucinantes, aconteceu a estreia no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 28 de dezembro de 1943, sob a direção de Ziembinski, que transforma o papel do diretor de teatro no Brasil. Até então, não se conhecia a figura do diretor como responsável pela linha estética do espetáculo. Pela primeira vez, com ele, o teatro elevou-se no Brasil, do plano das comedinhas de circunstância ou dos dramalhões da pior tradição lusitana.
A cidade aguardava aquela estreia com ansiedade. Quando acabou, houve um silêncio sepulcral. Depois, umas palavras, mais outras, e a ovação consagradora. “Vestido de Noiva” é considerado como o marco da nova dramaturgia brasileira. Texto fragmentário e ousado, sobre as lembranças e delírios de uma mulher que agoniza durante uma cirurgia.
Nelson Rodrigues, incansável, escreveu, entre 1941 e 1990, 16 peças, nove livros, dois contos, um sem- número de crônicas, três novelas para TV e 20 filmes. Mas, será lembrado para sempre como o autor genial de “Vestido de Noiva”
Inteligência precoce de Nelson aliada à sua imensa curiosidade levaram a observar agudamente o mundo que o rodeava. Esse mundo era feio, vulgar, barulhento, eivado de pequenas e grandes intrigas, fofocas, escândalos, loucuras, doenças, humanidade enferma, tosses na madrugada em dueto, pernas enroladas de gazes escondendo varizes, funerais espetáculo, frustrações, gorduras, cheiro de suor, um ou outro escarro sanguinolento pelas ruas.
O homem no seu drama de bicho da terra e uma criatura exilada de Deus, as matérias-primas de seu teatro são o parto e a morte. A vida funciona como um intervalo entre um e outra. Nelson criou, através de seu diálogo rude, cru, contundente, uma nova maneira de se fazer teatro. Criou, ou melhor, gerou o expressionismo teatral brasileiro, porque seria quase impossível interpretar de forma convencional “civilizada” essa enxurrada de energia, sensualismo, deboche, tudo elevado quase às raias da loucura.
Máximas de Nelson Rodrigues:
“Não se pode amar e ser feliz ao mesmo tempo”; “todo amor implica uma servidão, mas uma servidão voluntária”; ”O amor é eterno, só acaba quando não era amor”; “Aos trinta anos a mulher começa a ser, realmente mulher, começa aproximar-se da plenitude dos seus encantos de corpo e de espírito”; “ a mentira mantém a máquina do mundo e impede que seja destroçado; "As relações humanas mesmo as mais íntimas, se constroem sobre a mentira e dela extraem sua melhor carga de poesia"; “Na ficção, as mulheres traem os maridos, mas são fiéis aos amantes"; “Nenhuma mulher trai por amor ou desamor. O que há é o apelo milenar, a nostalgia da prostituta que existe ainda na mais pura “; ”O marido não deve ser o último a saber. O marido não deve saber nunca”; “Num casal há fatalmente um infiel, a existência de uma vitima é inevitável; é preciso trair , pra não ser traído”; “A educação sexual só deveria ser dada por um veterinário".