Fernando Rossi: Antígona - Convite a uma reflexão sobre o poder e o amor
Fernando Rossi 03/06/2020 18:32 - Atualizado em 17/06/2020 18:03
Elenco da recriação do clássico de Sófocles
Elenco da recriação do clássico de Sófocles / Divulgação
Assim a dramaturga Aninha Franco definiu seu texto, “Antígona”, uma recriação do clássico de Sófocles. A leitura dramática desta versão, foi escolhida para abrir a série “Leituras Santas”, promovida pela Santa Paciência Casa Criativa na próxima quarta-feira (10), às 20h. O publico poderá conferir a leitura através do Instagram @santapacienciacasacriativa.
A "Antígona" de Sófocles, escrita no século V antes de Cristo, apogeu da Grécia Clássica, é uma das obras mais significativas sobre o poder e o amor. Por isso mesmo, segundo Aninha, “vários dramaturgos releram o texto em períodos confusos da história”, observa, citando Jean Cocteau, Jean Anouilh e Bertold Brecht.
No período da ditadura militar no Brasil, a peça foi vetada, e uma absurda ordem de prisão contra Sófocles — um grego morto a 2.500 anos — expedida, de acordo com ela. Nazismo, fascismo, ditadura no Brasil e na Argentina, e desmandos palacianos não escapam à recriação de "Antígona" por Aninha Franco, que manifesta sua intenção de “levar as pessoas a refletirem sobre o poder e o amor”.
Depois de uma temporada de sucesso de público e crítica em 2013, no Anexo do Theatro XVIII, a leitura dramática de "Antígona", recriação do clássico de Sófocles da escritora Aninha Franco, foi apresentada no Museu Rodin, no Festival da Cidade, durante as comemorações do aniversário de Salvador. A leitura teve a participação das atrizes Beth Coelho (Antígona), Rita Assemany (Coro) e do ator Ricardo Bittencourt (Creonte).
A reflexão sobre a política, de uma maneira geral, é um dos traços marcantes nos textos da premiada dramaturga, nacionalmente reconhecida pelo trabalho realizado há quase duas décadas no Theatro XVIII.
O texto mostra a visão grega através de questionamentos contemporâneos das transgressões que ainda infringem leis naturalmente impostas pela divindade no coração humano. Daí, talvez, tais ações ainda são consideradas verdadeiras aberrações, já que, uma vez Édipo desposando a própria mãe ,tornar-se-ia irmão e pai de seus filhos, como veio a acontecer, fusão de posições inconcebíveis para a natureza.
Édipo foi realmente um típico herói trágico. Demasiadamente contemporâneo com todas as suas imperfeições. Sendo ingênuo acerca de sua realidade e indefeso diante de seu destino, no texto instigante de Aninha ganha um tom de rebeldia nada planfletária, além de sobre ele pairar o justificável e legítimo argumento de ignorar a verdade sobre suas origens e nada poder fazer para fugir de seu inescapável destino, premissa cultural da obra, que foi profetizado pelo oráculo de Apolo em Delfos, qual seja, o de matar seu pai e desposar sua mãe, incorrendo numa irreversível transgressão à ordem natural e trazendo sobre si um pecado familiar e sua consequente maldição.
Impossível não lembrar de outras Antígonas pós-modernas, como FriedaKahlo, Marlene Dietrich, Pagu, Florbela Espanca e/ou Madonna. Nota-se que Aninha descreveu as primeiras partes do texto com o intuito de explorar ao máximo a ideia de desafiar o abismo entre a lógica e a normalidade, jogando de uma só vez na cara dos que ainda estão dormindo no túmulo da sala de estar os questionamentos do imponderável. Os interesses pessoais e sentimentos egoístas de Creonte, que pensaram limitar o que era superior e mais amplo, não a afetaram. Ou, se o afetaram, ele escondeu muito bem. A trama demonstraria quão acertada foi a convicção que tomou, pois o convencimento de Creonte foi arrogante como arrogante são todos aqueles que se deixam dominar pelo poder.
E a hipocrisia, a solidão, o medo, a farsa, as falsas amizades virtuais, o nazismo, fascismo, ditadura no Brasil e Argentina e desmandos palacianos não escapam à recriação de “Antígona” por Aninha Franco.
“Leitura Santas” apresenta “Antígona”. No elenco, os atores Beatriz Agra, Pedro Fagundes, Caio Paes Freitas e Rosângela Queiroz. Apoio técnico: Alexandre Ferram. Direção: Fernando Rossi. Vale conferir.

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