Aldir Sales
30/05/2020 09:33 - Atualizado em 03/06/2020 19:15
A semana da política na região foi marcada pela decisão do ministro Og Fernandes, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que definiu uma das novelas mais longas no cenário jurídico-eleitoral do Norte Fluminense. O magistrado determinou a anulação da operação Machadada – deflagrada em 2012 – e, por consequência, das condenações em primeira e segunda instância da prefeita de São João da Barra, Carla Machado (PP). Ela já havia conseguido um efeito suspensivo na presidência do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) para que não ficasse inelegível até uma análise definitiva do TSE. Agora, Carla fica sem qualquer impedimento para concorrer ao pleito inicialmente marcado para outubro.
A principal alegação da defesa que foi acatada pelo ministro é de que foram irregulares as gravações de áudio e vídeo onde o então vereador e candidato a vice-prefeito Alexandre Rosa e a própria prefeita apareceriam, segundo a denúncia, aliciando candidatos de oposição. Além de Carla e Alexandre, também eram réus no processo o ex-prefeito José Amaro Martins, o Neco, e o vereador Alex Firme.
Nas redes sociais, a prefeita comemorou a decisão e a classificou como uma “reparação”. “Encarei todo esse processo com a certeza de que a verdade iria prevalecer, pois não cometi nenhum crime na eleição de meu sucessor, em 2012. Essa decisão é a reparação de um erro que trouxe sofrimento para mim, minha família e que foi utilizado por oito anos pelos meus adversários políticos. Seguiremos em frente, combatendo o bom combate e pedindo a Deus sabedoria”, declarou.
A operação Machadada foi deflagrada pela Polícia Federal em 3 de outubro de 2012. O grupo governista, liderado à época pela então prefeita Carla Machado, foi acusado de abuso de poder e cooptação ilícita de nomes da oposição, oferecendo vantagens financeiras indevidas e cargos na administração pública municipal. A denúncia foi impetrada pelo Partido da República (atual Partido Liberal), a coligação “São João da Barra vai mudar para melhor” e o então candidato a prefeito Betinho Dauaire.
Por sua vez, Betinho também utilizou as redes sociais para dizer que vai recorrer da decisão.
— A decisão monocrática do ministro não desmentiu a veracidade das acusações do abuso do poder político e financeiro praticado pelos réus, mas apenas a prova apresentada (as gravações), que, para o ministro, não servem como provas. Na prática, devido a demora da decisão, que foi de oito anos, apesar dos réus terem sido condenados em primeira e segunda instância, jamais qualquer decisão me devolveria o direito de disputar uma eleição limpa, apenas me provocou descrença na equidade da disputa e o meu afastamento dela. Por tanto, fica aqui a minha confiança no trabalho realizado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. Quanto à ação, ela está entregue aos advogados, que me informaram que vão recorrer e interpor agravo interno para que o plenário do TSE julgue. No mais, é agradecer os onze mil votos recebidos pelo sanjoanenses e constatar que a justiça e a verdade nem sempre andam de mãos dadas.
Na decisão, Og Fernandes justificou o motivo pelo qual considerou a prova ilegítima. “Da leitura do acórdão, está claro que a Corte regional, apesar de reconhecer que o TSE havia firmado posição para o pleito de 2012 no sentido de que a gravação ambiental, sem autorização judicial, feita por um dos interlocutores sem o consentimento do outro era ilícita, entendeu pela licitude da prova devido à reversão desse entendimento em eleições posteriores”, disse Og Fernandes, que continuou:
“Assentou, ainda, que o Supremo Tribunal Federal considerava lícita a gravação ambiental à época dos fatos, entendimento que permanece inalterado. No entanto, sem razão o acórdão regional. Com efeito, para as eleições de 2012, o TSE assentou ser ilícita a prova decorrente de gravação ambiental realizada, sem autorização judicial, por um dos interlocutores sem o conhecimento da outra parte. A única exceção a essa regra ocorreria se a gravação ambiental fosse realizada em ambiente aberto, hipótese estranha à destes autos”.
Advogado não crê em nova mudança
Tabelião e advogado com larga experiência no âmbito eleitoral, Robson Maciel explicou que ainda cabe recurso e que o caso pode ser levado ao plenário do TSE, mas disse que acha difícil uma mudança de decisão.
— Ainda cabem recursos de embargos de declaração e, eventualmente, um agravo. O que resta agora é esperar os prazos recursais. Se recorrerem, sim (pode ir ao plenário). Mas é praticamente natimorto, pois a tese foi reconhecida pelo plenário recentemente em casos semelhantes. Ou seja, o recurso, se interposto, será meramente protelatório porque o Og aplicou o entendimento do pleno.
Robson Maciel também relatou que o ministro do TSE acatou o mesmo argumento da ilegalidade das gravações que levou a presidência do TRE conceder efeito suspensivo para todos os réus permanecessem elegíveis até uma decisão definitiva. “Todos os recorrentes estão elegíveis desde a decisão do TRE, com efeito suspensivo. O argumento para a concessão do efeito suspensivo foi o mesmo que levou o ministro a ter essa decisão de elegibilidade de todos”.
Operação foi deflagrada em 2012
De acordo com a denúncia que embasou a operação Machadada, ao sair de um comício, já na madrugada do dia 3 de outubro de 2012, Carla e o então vereador Alexandre — que era candidato a vice na chapa encabeçada por Neco e em 2016 se elegeu para o mesmo cargo na chapa da atual prefeita — chegaram a ser presos pela Polícia Federal e levados para a delegacia de Campos. Pela manhã, eles foram liberados.
Existia a expectativa de a sentença ser proferida antes do processo eleitoral de 2016. Carla e Neco, aliados em 2012, foram adversários na disputa pela Prefeitura no último pleito e, caso condenados em primeira e segunda instâncias, não poderiam sequer concorrer. No entanto, a defesa de Alex Firme levantou a suspeição do então juiz da 37ª Zona Eleitoral de SJB, Leonardo Cajueiro. O magistrado não acatou o pedido, mas o processo ficou suspenso até análise do TRE. Somente no fim de novembro de 2016, após o pleito, a Corte Eleitoral rejeitou a suspeição.
A sentença de primeira instância da Aije instaurada em 2012 só foi proferida em março de 2017. Cerca de seis meses depois, o TRE manteve a inelegibilidade de Carla, Neco Alexandre e Alex. Apesar da condenação em colegiado, foi publicado um efeito suspensivo da condenação, em março de 2018, por meio de um embargo de declaração concedido de forma monocrática pelo então presidente em exercício do Tribunal Regional Eleitoral, desembargador Carlos Santos de Oliveira.