Ícaro Barbosa
03/05/2020 00:07 - Atualizado em 08/05/2020 20:57
O pedido de demissão de Sergio Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública, na sexta-feira (24), caiu como uma bomba em Brasília e também na base de apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). O ex-juiz acusa seu antigo chefe de tentar interferir politicamente na Polícia Federal para ter acesso à informações sigilosas. Bolsonaro negou e disse que Moro se preocupava em ser indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF). A Procuradoria-Geral da República abriu inquérito para investigar o caso e o ministro Alexandre de Moraes, do STF, barrou a nomeação de Alexandre Ramagem – amigo da família Bolsonaro – para a chefia da PF. O ex-capitão afirmou que a decisão judicial foi política e recebeu fortes críticas. Segundo pesquisa do instituto Datafolha realizada na última segunda-feira (27), 52% dos entrevistados disseram que acreditam mais em Moro, enquanto 20% acham que o presidente fala a verdade. Mesmo assim, o índice dos que aprovam o governo se manteve na casa dos 33%. Em Campos, eleitores declarados de Bolsonaro demonstraram suas insatisfações e, mesmo alguns que continuam apoiando o ex-militar, não deixaram de criticá-lo e lamentaram a saída de Sergio Moro.
Cirurgião dentista e ex-integrante do PSDB campista, Alexandre Buchaul declarou voto em Bolsonaro no primeiro e segundo turno da eleição de 2018, mas criticou também as demissões de outros ministros.
— Achei que o (Luiz Henrique) Mandetta (Saúde) fazia um bom trabalho no combate à pandemia de coronavírus, especificamente. Não nos é dado saber tudo que acontece nos bastidores de Brasília, mas achei desproposital. A saída do (general Carlos Alberto) Santos Cruz (Secretaria de Governo), talvez pelo momento ou pela pasta que ocupava, não trouxe maiores impressões. A saída do Moro, pela forma como se deu, trouxe grande repercussão e impacto na sociedade. São muitas interrogações sobre as motivações que não foram adequadamente esclarecidas — disse Buchaul, que finalizou afirmando ser contra impeachment do presidente.
Líderes do movimento universitário UFF Livre, Eraldo Duarte e Letícia Mattos, ambos alunos do curso de Ciências Sociais, questionaram a capacidade de Bolsonaro de lidar com crises.
— O presidente abraçou algumas ideias radicais quanto à quarentena e isso o colocou em rota de colisão com Mandetta, criando uma crise política desnecessária. Essa falta de tato me fez questionar a capacidade do presidente de lidar com crises — comentou Eraldo Duarte.
Letícia, por sua vez, afirmou que a direita política não pode ser confundida com Bolsonaro. “O governo tem se atrapalhado muito. Se Bolsonaro não for bom o suficiente, trocaremos ele. A direita não pode morrer com ele. Se criticamos os petistas e a esquerda brasileira em geral, por que agiremos da mesma forma? O Brasil, ao contrário do que Olavo de Carvalho afirmou, não precisa de uma ‘militância bolsonarista’, precisamos de uma militância conservadora”.
Médica cardiologista, Mirza Kury também foi eleitora do Jair Bolsonaro, político que conheceu no processo de impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016. Ela relatou ter identificado no então deputado boas intenções e sinceridade. Ela segue apoiando o presidente, mas fez uma ressalva: “Continuo torcendo para Bolsonaro concluir seu mandato, mas confesso ter retirado a venda dos meus olhos”.
Desaprovação também vem de juiz aposentado
Ex-promotor de Justiça e juiz aposentado, o advogado Fernando Miller também votou no ex-capitão, mas foi outro a deixar o barco bolsonarista após as graves acusações do seu ex-colega da magistratura.
— Confesso minha decepção com o presidente eleito e minha indignação diante de todos os atos insanos e irresponsáveis que ele vem praticando. Bolsonaro tem demonstrado que não tem sequer noção da importância do cargo que exerce. Que decepção! — declarou Miller no grupo de WhatsApp do programa Folha no Ar, da rádio Folha FM 98,3.
Há mais de 20 anos trabalhando na função de inspetor em uma escola particular da cidade, o carismático Josival Pimenta – que ficou conhecido por seu apoio e esforço durante a campanha de Jair Bolsonaro – afirma que nem a demissão de Mandetta ou a renúncia de Sérgio Moro mudaram sua opinião porque, segundo ele, não houve provas de irregularidades.
— Contudo, se espelhar e citar o governo PT na tentativa de justificar os mesmos erros não nos faz (referindo-se aos eleitores de Bolsonaro) melhores do que eles. A Polícia Federal é uma polícia de Estado, não de um presidente. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin), sim, é um órgão de investigação exclusivamente do governo. Não se faz justiça com o erro dos outros, muito menos com os de um partido condenado muitas vezes — concluiu Josival Pimenta.
MBL quer abrir processo de impeachment
O núcleo do Movimento Brasil Livre (MBL) de Campos, grupo que exerceu influência no impeachment de Dilma em 2016, representado por Paulo André Gomes, também deu sua opinião sobre a debandada de apoiadores do Bolsonaro, inclusive do movimento que compartilha parte das origens do bolsonarismo:
— Jair Bolsonaro nunca foi a primeira opção do MBL como movimento. Durante o segundo turno, fizemos manifestações contra a candidatura do PT. Quando eu tive que escolher entre um petista com políticas de controle estatal, uma visão totalmente desastrosa de economia, e um candidato que se apoiava em reformas econômicas liberais importantíssimas para o país, a segunda opção foi mais coerente. Não me arrependo por causa do contexto. Mas isso não implica em agora deixar de cobrar — explicou Paulo.
Ele lembrou, ainda, as manifestações convocadas pelo presidente contra o Congresso e Supremo Tribunal Federal e defendeu o impeachment de Bolsonaro.
— Pessoalmente, desde o momento em que o presidente da República convoca as pessoas e comparece a um evento pedindo pela volta do Ato Institucional n° 5, ele deve sofrer o impeachment, e agora temos mais de um motivo para levar esse impeachment à frente.
Nas redes sociais, o MBL tem convocado seus seguidores para apoiar o afastamento do presidente e criticado as declarações contrárias ao isolamento social, recomendado pelas autoridades de saúde para evitar a proliferação do coronavírus.