Dom Américo: um ícone da história musical campista
Matheus Berriel 29/05/2020 23:10 - Atualizado em 17/06/2020 18:04
Cantor, compositor e instrumentista morreu na última segunda, aos 69 anos
Cantor, compositor e instrumentista morreu na última segunda, aos 69 anos / Antônio Filho
Nascido em 18 de fevereiro de 1951, o campista Osvaldo Américo Ribeiro de Freitas chegou ao mundo com a missão de cantar e alegrar as pessoas com seu bom humor. Influenciado por Cauby Peixoto e Agnaldo Timóteo, quando adolescente ainda não tinha noção de que as primeiras apresentações, em 1967, nos tempos de estudante da Escola Agrícola Estadual Antônio Sarlo, eram a porta de entrada para uma carreira de sucesso na música, com 53 anos de duração. Osvaldinho na infância, Osvaldão para os fãs mais antigos, Dom Américo para a legião que o acompanhou, o cantor, compositor e instrumentista morreu na última segunda-feira (25), aos 69 anos, por falência múltipla de órgãos. A Prefeitura de Campos decretou luto oficial de três dias.
O ingresso do artista no cenário profissional da música se deu em 1969, como crooner do conjunto The Kings, de São João da Barra. Em meados da década seguinte, passou a integrar o Apollo 7, da cidade mineira de Tombos. Retornou a Campos em 1980, para a Banda Abertura, onde permaneceu por 16 anos, até montar a célebre banda Dom Américo e Seus Comparsas, dividindo palco, entre outros músicos, com seu filho mais velho, Apollo Ramidan. Nos bastidores, considerava indispensável a ajuda do assistente Alexandre, por ele apelidado de “Tim Maia”.
A mudança de Osvaldão — apelido do início da carreira devido ao seu 1,96m de altura e ao peso elevado, que perdeu no consideravelmente no início deste ano por tratamentos com hemodiálise — para Dom Américo deveu-se a uma recordação do primogênito Apollo. Um produtor da gravadora PolyGram chegou a sugerir “Valdo de Oz” e “Amerix”. Mas, o nome artístico definitivo surgiu após o filho lembrar que, na infância, o chamava de “Dão”, adaptando para “Dom” com o passar do tempo. Coube à criatividade de Osvaldão juntar o termo carinhoso ao seu segundo nome.
O sonho do primeiro LP, intitulado “Pecado de Amor”, virou realidade em 1987, pela Abertura Discos, com o artista ainda assinando como Osvaldo Américo. Foi quando gravou pela primeira vez a música “New York, New York”, de Fred Ebb e John Kander, internacionalmente conhecida na voz de Frank Sinatra. No LP “Tudo Trick”, de 1988, pela CMA Discos, veio seu maior sucesso, “Butterfly”, canção de Paulo Debétio e Paulinho Rezende que o acompanhou por toda a carreira. Também fazem parte do disco suas composições “Mayko” (com Duda), “Traçado com Blues” (com Luia e José Renato), “Pó de Mico” e “Tudo Trick” (ambas com Daniel Trindade).
Em 1990, foi a vez do álbum “Luminosidade”, pela Phonogram/Polygram, precedendo o LP “Universo”, de 1992, pelo selo Tropical/Polygram. Neste, teve destaque a canção “Droga”, de Antônio José. Fã de Tim Maia, Dom Américo lançou o LP “Para Animar a Festa” em 1993, pela Albatroz/Polydisc, com músicas do ídolo. Completa a sua discografia o CD “Salsa Brasil”, de 1996, pela BMG Brasil, com canções carregadas de humor. Em 2001, participou do CD “Swing Bahia”, de Gil Paixão, pela gravadora Paulitura, interpretando “Nas Ondas Do Desejo (Nunca Me Esqueça)”, de Marrom.
Desde cedo, o sucesso sempre rodeou o artista, tido por muitos como o maior da história musical da planície goitacá. Migrou dos bailes e bares para o trio elétrico, tornando-se presença constante nas programações de verão do Farol de São Thomé. Seu último show na praia campista aconteceu em 25 de fevereiro, fechando o Carnaval 2020. Durante a folia, também se apresentou nos municípios de São João da Barra e Quissamã.
Nos palcos, chegou a se apresentar ao lado de nomes como o ídolo Agnaldo Timóteo e a cantora Joanna. Fora deles, Osvaldão era professor, formado em Ciências Agrícolas e Pedagogia pelo Colégio Agrícola de Campos, do qual foi aluno de 1964 a 1970, se destacando como instrutor de sua banda marcial, posteriormente rebatizada como Professor Osvaldo Américo. Mais tarde, integraria o corpo docente da instituição de 1973 a 1995. Especialista em paisagismo e jardinocultura, foi convidado a conceber o projeto do cemitério Parque Campo da Paz, onde atuou como gerente até 1994 e teve seu corpo sepultado na segunda-feira. Não houve velório em razão da pandemia do novo coronavírus.
Dom Américo sofria de diabetes e hipertensão. Estava internado desde a madrugada de 2 de março no Hospital Geral de Guarus (HGG), após ter sentido intensa falta de ar, e, desde então, seu quadro era grave, incluindo insuficiência renal. De acordo com o blog Ponto de Vista, de Christiano Abreu Barbosa, hospedado no Folha1, há suspeita de que tenha contraído Covid-19. Um teste foi realizado, mas o resultado ainda não saiu. Ele deixa quatro filhos e três netos.
Projeção em rede nacional — Dono de um talento que merecia ser conhecido por todo o Brasil, Dom Américo teve aparições em programas televisivos como o “Clube do Bolinha” e o “Italianíssimo”, este de Augustinho Záccaro, ambos na TV Bandeirantes. Seu grande momento de exposição em rede nacional, contudo, foi uma entrevista no “Jô Soares Onze e Meia”, do SBT, em 1996. À época, pesando 180 quilos, divulgava o CD “Salsa Brasil”. Também passou pelo “Programa Ana Maria Braga”, da Rede Record, e pelo “Sem Censura”, de Leda Nagle, na antiga TVE Brasil.
Reconhecimento — Em 30 de junho de 2016, os 49 anos de carreira de Dom Américo foram celebrados em um concerto da Orquestra Sinfônica Mariuccia Iacovino, promovido no Teatro Municipal Trianon pela Organização Não Governamental Orquestrando a Vida. Na ocasião, o artista dividiu palco com jovens músicos da ONG, que na última terça realizou uma live como homenagem póstuma.
Em 2018, Dom fez um show pelos 51 anos de carreira no Asilo Monsenhor Severino. No mesmo ano, em 17 de dezembro, recebeu da Câmara dos Vereadores de Campos a Ordem do Mérito Wilson Batista, honraria conferida em reconhecimento a personagens de destaque musical no município. Conta ainda com página própria no site do Dicionário Cravo Albim da Música Popular Brasileira, mantido pelo Instituto Cravo Albim.
Com 53 anos de carreira e 69 de vida, Dom Américo marcou seu nome entre os maiores da cultura campista
Com 53 anos de carreira e 69 de vida, Dom Américo marcou seu nome entre os maiores da cultura campista / Antônio Filho
 
Palavras que imortalizam uma voz
“Olhares e sorrisos sempre se abriram para mim quando apresentado como Osvaldinho, filho de Osvaldão. Isso, desde criança, me deu a noção do tamanho e da importância do meu pai para várias gerações de fãs. Para mim, ele sempre foi um super-herói, com avatares próprios e um superpoder: a voz. E acho que eu estava certo. Ele é um imortal”. — Osvaldo Américo Segundo, filho
“Sempre enchi a boca para falar de quem sou filho, e para sempre falarei, com muita honra. Herdei o mesmo jeito brincalhão e de talentoso ‘piadista’. Também nasci com um pouco da voz diferenciada de artista que canta e encanta, entre outras qualidades, como a facilidade de semear amizades. Estou aqui para dar continuidade e representar esse incrível herói que nos deixou”. — Mauro César, filho
“Eterno no coração de todos. Pai, avô, amigo, artista e um ser humano inesquecível, que sempre semeou o bem, além de possuir uma índole e caráter inigualáveis. Usou o seu ‘Dom’ de cantar e encantar para levar alegria e felicidade. Amado e querido por todos. Tenho muito orgulho do legado que nos deixou. Todos os momentos ficarão guardados em nossas memórias”. — Márcio Ady, filho
“Foi minha maior fortaleza, meu escudo. Sempre tivemos muita afinidade e cumplicidade. Isso fará uma falta enorme, a ponto de não conseguir imaginar minha vida sem ele, meu melhor amigo. Deixa um legado de muito amor, hombridade, e uma riqueza cultural ímpar. Com Deus e Nossa Senhora, a gente segue. Vamos continuar levantando a bandeira Dom Américo”. — Apollo Ramidan, filho
“Um grande amigo que parte depois de uma difícil batalha pela vida. Sua voz e seu exemplo de caráter e dedicação ficarão para sempre na nossa lembrança. Sua alegria também estará sempre presente, nos inspirando a ser pessoas melhores. Que Deus o receba de braços abertos e conforte seus familiares e amigos”. — Rafael Diniz, prefeito de Campos
“Credito a ele um legado de raro talento e excepcional musicalidade, associados a um ser humano pleno de ternura e imbatível na interação com seu público. Deixa um vazio muito grande. Cumpriu a missão de fazer da arte a sua grande aliada e intérprete para tocar os corações que hoje choram pelo seu adeus”. — Cristina Lima, presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima
“Falar de Dom Américo é falar de uma força, uma alegria, uma energia, de um grande astro. De uma voz encantadora. De uma simplicidade e da beleza do encantamento dos seus shows. Da preocupação com o ser humano. Marcou e marca a música de nossa cidade. Deixa mensagens maravilhosas. Será eterno”. — Jony William Vianna, presidente da ONG Orquestrando a Vida
“Teve reconhecimento do povo de sua terra enquanto viveu, e construiu as bases de uma trajetória de muito trabalho, brilho e dignidade. Recebeu flores em vida; nosso pranto e as nossas preces ao silenciar seu canto. Grande amigo! Sempre carinhoso e atencioso. Permanecerá para sempre em nossos corações”. — Hélio de Freitas Coelho, ex-presidente da Academia Campista de Letras
“Veio como um arco-íris, nos cobrindo de uma tempestade. Nos deu a alegria de uma criança ao girar no carrossel. Mas, nosso butterfly embarcou na garupa da saudade. Nos lembraremos dele a cada sol brotando no canteiro, no voar de uma borboleta, no desabrochar de uma flor. Descanse em paz, amigo”. — Wellington Cordeiro, presidente da Associação de Imprensa Campista
“O conheci quando ainda era Osvaldão e já superlotava casas noturnas. Campos perde uma das suas vozes mais marcantes, e o Centro Cultural Marcelo Sampaio, a oportunidade de homenageá-lo em vida. Já estava combinado com ele, teria direção musical de Matheus Nicolau. Ficamos mais pobres artisticamente”. — Marcelo Sampaio, presidente do Conselho Municipal de Cultura de Campos
“Foi o artista com quem mais trabalhei. Como todo campista, já nasci fã do nosso grande astro. E, por acasos da vida, nos tornamos amigos, com quase 15 anos de convivência. Não tenho palavras para resumir meu carinho, respeito e a admiração por aquele que foi o maior artista de Campos. Siga brilhando, amigo!”. — Antônio Filho, jornalista e apresentador da Plena TV
“Centro do Rio, anos 1990, encontro o gigante dirigindo seu carro. Sabedor de meu trabalho na Manchete FM, ele disse: ‘Eu falava, você iria longe!’. Respondi: ‘Sim, trabalhei em Foz do Iguaçu!’. Gargalhou alto, como se estivesse na amada Campos dos talentos inigualáveis de Didi, Amarildo e Dom Américo, um trio perfeito de futebol e música”. — Nino Bellieny, jornalista e blogueiro do Folha1

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