Ethmar Filho: 'Principles of Orchestration'
Ethmar Filho 29/05/2020 22:58 - Atualizado em 03/06/2020 18:07
De uma forma geral, por prazer e por praticidade, gosto de escrever para os nossos leitores, principalmente os que se interessam por música, com grifos em fatos interessantes dos autores e intérpretes da música brasileira e universal. Mas, quem é que não gosta de música? É ruim da cabeça ou doente do pé. Ah! Isso é o samba! Mas o samba, o nosso samba, poderia muito bem ser enviado a qualquer premiação mundial como digno e legítimo representante da música de bom gosto, seja no Carnegie Hall ou em qualquer botequim onde haja uma mesa, uma cerveja, ovos cozidos coloridos e uma caixa de fósforos, tamanha sua versatilidade.
Mas hoje gostaria de falar mais especificamente aos músicos arranjadores e orquestradores, tais como eu, bichos esquisitos e estudiosos, portadores de óculos grossos e lapiseiras finas que, como disse Jack Dawson, o personagem de Leo di Caprio em “Titanic”, até aqui sobreviveram mas “ [...] after that they are on God’s good humor.” (Depois disso eles estão ao sabor do bom humor de Deus). Gente que vive de muita técnica, sangue musical e, principalmente, de sentimentos. Mas como técnica aprende-se mais do que ensina-se, diria meu querido professor Ian Guest, sangue musical tem que vir no sistema operacional desde a concepção, também diria meu outro querido mestre Guerrinha e, sentimentos eu mesmo diria, são como crianças; não podem dirigir o carro, mas também ninguém deixa ir no porta-malas, no final o que importa é o resultado sonoro que vai flechar diretamente o coração do ouvinte. Para os que precisam de sentimentos e sangue musical, se até certa altura dos acontecimentos não rolar, recomendo desistir.
Mas se a questão é técnica musical, recomendo estudar diuturnamente, gostar de solidão e cercar-se das melhores classes de alunos, lugar onde serão encontrados os melhores professores; bons professores, até lecionam, mas não ensinam para alunos medíocres, pode acreditar nisso! Recomendo também o livro “Principles of Orchestration” de Nikolay Rimsky-Korsakov, uma publicação que coloca o estudante de orquestração, regência e arranjo a par de tudo o que uma orquestra sinfônica pode e deve representar para o músico. Korsakov, o grande mestre russo das óperas e suítes sinfônicas, tais como Capriccio Espagnol, o poema sinfônico Scheherazade e Abertura da Grande Páscoa Russa, nesse livro expõe, de forma definitiva, o papel de cada instrumento das três principais seções da orquestra. Em seu prefácio, vejam só, chama Mozart e Haydn de “os pais da moderna orquestração”, descrevendo Beethoven como uma figura colocada “à parte”: “Sua musica é abundante em inumeráveis saltos leoninos de imaginação orquestral, mas sua técnica, vista em detalhes, permanece muito inferior à sua concepção titânica.” Diz também, ainda sobre o mestre Luwig, que o emprego dos trompetes, que ele chama de um emprego exagerado, “destacando-se sobre as cordas, causam ao estudante de Beethoven mil e um tropeços e pontos contraditórios.” Enfim, opinião ilibada do mestre Korsakov que me permito discordar. Mas a música, que é feita da mesma matéria prima de que são feitos os sonhos, lança mão de seu espaço criativo para abrigar opiniões com essas. Observações pertinentes e ensinamentos impecáveis enchem o livro de bons motivos para ser lido, relido e estudado em sua edição nova-iorquina da DOVER PUBLICATION, Inc.
Maestro Ethmar Filho – Mestre em Cognição e Linguagem.

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