Fernando Rossi: Vivemos um metadrama ou metateatro?
Fernando Rossi 28/04/2020 16:54 - Atualizado em 08/05/2020 21:42
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O termo “Metateatro” se aplica às obras dramáticas que remetem para si próprias, enquanto textos de representação. Vamos encontrá-lo em inúmeros textos, quando se interroga se aquilo que está a viver é algo que realmente está acontecendo ou não passa de um sonho ou um produto da fantasia. Esta situação da personagem que interroga a veracidade da situação dramática é recorrente em quase toda a literatura ocidental. É o “teatro autorreferente”. Shakespeare lega-nos uma galeria de exemplos de metadrama, desde os mundos representados em “Midsummer Night’s Dream", onde a fantasia dialoga com a realidade, até "Hamlet", um exemplo clássico de metateatro por tratar de problemas de representação dentro da própria representação. A essa técnica de auto-reflexão do teatro dentro do teatro, a crítica inglesa chama de the play within a play.
Na dramaturgia brasileira, Oswald de Andrade é apontado como um marco metalinguístico, conceito atualmente desenvolvido por Antunes Filho (Grupo de Teatro Macunaíma), entre outros. Com a montagem de “Antígona de Sófocles”, Antunes mostra que o metateatro não é apenas um simples recurso narrativo (teatro dentro do teatro), mas, sim, um retorno ao ritual arcaico, à epifania, ao tempo cíclico e à atualização ritualística do ato mítico. O metateatro nos leva de volta às origens dramáticas.
Em primeiro lugar porque a tragédia metatreatalizada transforma o espaço físico em metafísico (nisso está o metateatro, no sentido menor). O ambiente da ação ocorre no plano da realidade histórica e no plano mítico ao mesmo tempo. Trata-se de um ‘Cenário Duplo’. Mas o que realmente caracteriza o radicalismo metateatral do Grupo Macunaíma é o fato de o deus Dionísio (o próprio Antunes) “dirigir” a peça do lado de dentro, transformando-a em um rito de passagem vivido pelos atores e assistido pelo público — e talvez essa diferença entre viver e ver seja a única fronteira que separa o ritual arcaico da tragédia pós-moderna.
É nesse sentido maior de metateatro que usamos o termo aqui. É claro que Antunes usa o metateatro dentro do espetáculo no discurso teatral, e nós gostaríamos de utilizá-lo dentro do cotidiano e da vida social nos discursos político e terapêutico, buscando repensar e superar o distanciamento e a diferença entre os papéis, os atores e o público. Uma coisa é o metateatro dentro do teatro; outra é a vida cotidiana.

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