Finalmente nesta quarta-feira (4) aconteceu o “casamento“ da atriz Regina Duarte e o presidente Jair Bolsonaro. Depois de um mês e meio de negociações, em que a atriz viajou a Brasília para conhecer a estrutura da pasta, ela tomou posse como secretária especial da Cultura, com a missão de encerrar a rotatividade da pasta e o desafio de erguer uma bandeira branca na conturbada relação do governo com a classe artística. “Meu propósito aqui é a pacificação e o diálogo permanente com o setor cultural”, disse, durante a cerimônia de posse.
Em nível local, o professor e poeta Adriano Moura vê com ceticismo sua gestão, uma vez que não vai romper com a estrutura atual da política cultural do governo Bolsonaro, que, segundo ele, é “discriminatória, segregadora e conservadora”. Por sua vez, o diretor de teatro Fernando Rossi observou que “ela, hoje, não representa a maioria da classe artística brasileira”, enquanto a presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, Cristina Lima” desejou êxito na missão “embora seja muito difícil a gestão de Cultura no país”.
Horas antes da cerimônia, depois de já ter exonerado servidores ligados ao escritor Olavo de Carvalho, ela virou alvo de olavistas nas redes, que se manifestaram colocando a hashtag #foraregina como o assunto mais comentado no Twitter. Na segunda-feira ( 2), Carvalho já havia questionado publicamente a atriz sobre como seria sua atuação à frente da Cultura e afirmou que a nomeação dela só foi possível com seu aval. Ontem, no evento, ela afirmou de forma taxativa: “O convite [de Bolsonaro] falava em carta branca, não vou esquecer”.
Ainda nesta quarta, o governo publicou 12 exonerações de servidores em cargos de chefia na Secretária Especial da Cultura, entre eles o agora ex-presidente da Fundação Nacional de Artes (Funarte), Dante Mantovani, que, em vídeo, disse que o rock leva “ao aborto e ao satanismo”. Próximo à atriz e presidente do órgão na gestão Dilma Rousseff (PT), o produtor Humberto Braga é cotado para voltar ao Governo e ocupar o cargo de Mantovani. A atriz também convidou o ator Carlos Vereza, outro ferrenho apoiador de Bolsonaro, para ser o número dois da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto, que administra a TV Escola.
Outros exonerados pela nova administração também pertencentes à ala olavista incluem Ricardo Freire Vasconcellos, diretor do Departamento do Sistema Nacional de Cultura; Paulo César do Amaral, presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram); Reynaldo Campanatti, secretário de Economia Criativa; Camilo Calandreli, secretário de Fomento e Incentivo à Cultura; Ednagela dos Santos Barroso dos Santos, diretora do Departamento de Promoção da Diversidade Cultural; Maurício Noblat Waissman, coordenador-geral da Política Nacional de Cultura Viva; Raquel Cristina Brugnera, chefe de gabinete da Secretaria da Economia Criativa; Gislaine Targa Neves Simoncelli, chefe de gabinete da Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura; Leônidas José de Oliveira, diretor-executivo da Fundação Nacional de Artes (Funarte); Marcos Villaça, secretário de Direitos Autorais e Propriedade Intelectual e Rodrigo Junqueira, secretário de Difusão e Infraestrutura Cultural.
Apoiadores de Olavo de Carvalho comentam nas redes sociais que essas exonerações são um indício de que Regina Duarte estaria alinhada com a esquerda política e acusam-na de ser “psolista”, “esquerdista” e “petista”. Por sua vez, a deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP) defendeu a nova secretária da Cultura no Twitter: “Respeitem Regina Duarte!”, escreveu, acrescentando que “desse jeito, quem vai derrubar o presidente é a turma que diz que o apoia”.
Opiniões locais:
Fernando Rossi (diretor de teatro)
“A postura dela é contraditória. Embora seja uma artista consagrada, ela, neste momento, não representa a maioria da classe artística brasileira. Ela fará parte de um governo que tem censurado e perseguido os artistas. Se fosse coerente, não deveria ter aceitado o cargo. Definitivamente, não vejo com bons olhos sua gestão à frente da Cultura”.
Adriano Moura (professor e poeta)
“Dificilmente ela vai romper com a estrutura da política cultural do governo Bolsonaro, que é discriminatória, segregadora e conservadora. Por isso, acho muito complicado sua gestão à frente da Cultura. Devemos lembrar ainda que sua escolha não foi técnica, mas sim um cala-boca para estancar uma crise enorme”.
Cristina Lima (presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima)
“A gestão da cultura no Brasil é muito complicada porque exige investimento e sensibilidade. Acho muito difícil que mude a estrutura atual da política cultural, uma vez que exercerá um cargo de confiança no governo. De qualquer maneira, torço para que faça uma boa gestão e seja feliz na missão que decidiu empreender”.