Paulo Renato Porto
29/02/2020 17:26 - Atualizado em 10/03/2020 15:09
Uma sucata que se transformar num negócio milionário que deve movimentar cerca de R$ 50 bilhões entre 2020 a 2040. Ao mesmo tempo em que se prepara para colher os benefícios do pré-sal, a Bacia de Campos passa a viver o seu primeiro ciclo de desmonte de instalações antigas, o chamado descomissionamento de plataformas sem vida útil que serão desativadas. O descomissionamento ocorre quando não há mais interesse econômico da empresa operadora na atividade ou ao final de vida útil das instalações de produção.
Para o superintendente de Petróleo, Gás, Tecnologia e Inovação de São João da Barra, Wellington Abreu, as atividades de desmonte das plataformas vão gerar muitos empregos e serviços.
— O descomissionamento vem sendo discutido na ANP já há alguns anos e já era esperado. Com certeza vai gerar empregos e muitos serviços, na maior parte direcionados para Macaé. Mas estamos na expectativa de que vários serviços deste processo de descomissionamento sejam efetuados aqui em São João da Barra, no Porto do Açu, e que os campos que não interessam à Petrobras sejam arrematados por outras petroleiras para que haja investimentos e retorno em royalties, mesmo com menor alíquota — analisou.
Para Eduardo Zacaron, gerente de descomissionamento da Petrobras, o prazo concedido às operadoras para definir as possibilidades de utilização das instalações é fundamental, mas outros pontos precisam ser discutidos.
— Os cinco anos de antecedência sem dúvida são um grande avanço, mas ainda podem haver outras questões a serem avaliadas como, por exemplo, o processo de cessão dos direitos. Quanto tempo vamos aguardar para definir a cessão? Em quais cenários a cessão de direitos é viável ou não? É importante analisar essas questões para que a gente tenha tempo de pensar outras alternativas.
Além do pré-sal, um novo mercado se abre - A ANP mira no exemplo do Mar do Norte para traçar essa nova indústria no Brasil. A estimativa é de que US$ 40 bilhões, nas próximas três décadas, circulem na Escócia para custear a retirada de plataformas de campos em fase de declínio, o que deve gerar 20 mil empregos. “O descomissionamento permite a migração de profissionais. Temos potencial para gerar algo similar aqui, com uma grande vantagem: nós não só temos um período de crescimento da produção (no pré-sal) muito relevante, mas também a possibilidade de abrir esse novo mercado”, disse Moura.
Pelo ineditismo e também pelos riscos ambientais, é mais complexo desmontar uma estrutura de produção de petróleo e gás instalada em alto mar – com plataformas e extensas redes de linhas submarinas – do que instalá-la. No caso do campo de Cação, o edital prevê a retirada de todos os equipamentos e materiais de superfície, como passarelas (gangways), guindastes, topsides e jaqueta, além de materiais identificados com a presença de radiação de ocorrência natural (NORM, na sigla em inglês). O escopo inclui ainda serviços de corte de equipamentos e estruturas submarinas.
Descomissionamento, atividade de riscos - De acordo com estimativas da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustiveis (ANP), cerca de 100 plataformas devem ser desmontadas nos próximos 20 anos, a maior parte da Petrobrás. Em média, a vida útil de uma dessas instalações é de 25 anos. No Brasil, há 66 nessa condição. Outras 23 estão se aproximando desta idade e, em brevemente, também serão desativadas. Neste caso, há 89 unidades candidatas ao desmonte, segundo a ANP.
A desativação de plataformas é uma atividade de sérios riscos ao meio ambiente, inclusive de contaminação do mar com material radioativo e também à segurança dos trabalhadores. Um exemplo de como um desmonte pode dar errado aconteceu em agosto do ano passado, quando 1,2 mil litros de óleo vazaram do navio plataforma Cidade do Rio de Janeiro, na Bacia de Campos. O vazamento ocorreu durante o descomissionamento — termo técnico para o trabalho de retirada das unidades de óleo e gás dos locais onde estavam instaladas.
Plataformas já serão desativadas este mês - Em fevereiro do ano passado, um projeto piloto foi lançado pela Petrobrás, com a licitação de três plataformas no campo de Cação, na Bacia de Campos, um contrato de US$ 30 milhões. Com duração de dois anos, o contrato tem início programado para março deste ano. Em uma palestra sobre o tema para executivos do setor, na Fundação Getúlio Vargas, no Rio, o superintendente de Segurança da Operação e Meio Ambiente da ANP, Raphael Moura, destacou as oportunidades que o ciclo de desmonte oferece.
— Com cerca de 100 plataformas e 1000 poços a serem abandonados nos próximos anos, nós temos a possibilidade de investimentos de R$ 50 bilhões. Esse é um número conservador. Há excelentes oportunidades de negócios, de geração de empregos que não podemos deixar passar. É uma grande oportunidade de negócios, de geração de empregos, de atividades de engenharia, não só para os profissionais estabelecidos e maduros, como para estudantes, engenheiros e planejadores que vem das universidades — enfatizou.
Obrigação de recuperar o meio ambiente - A nova regulamentação estabelecida pela ANP foi desenhada tendo como princípio que “aquele que explorar os recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado”, como prevê a Constituição. Isso impede, por exemplo, que a indústria petroleira abandone instalações inteiras, ou ao menos parte delas, no fundo do mar.
Outro desafio para as companhias petroleiras, na fase de descomissionamento, é a segurança dos trabalhadores envolvidos no desmonte. Outro ponto é o risco de resíduos, inclusive radioativos, acabarem no mar.
Resolvidas essas questões, falta definir como as plataformas devem ser transportadas até a costa, para então serem desmembradas e transformadas em matéria-prima para a indústria siderúrgica. Nessa etapa, o maior perigo é de contaminação entre o local onde a embarcação estava instalada, no litoral, e a base de apoio, em terra.
Segundo especialistas, essas atividades de descomissionanento devem ser estudadas e analisadas sob a ótica de três disciplinas: Meio Ambiente; Riscos e Incertezas: Análise de Risco; e Logística.