*Felipe Fernandes
29/02/2020 18:27 - Atualizado em 24/03/2020 17:59
A nova onda dos grandes estúdios de Hollywood é a criação de universos compartilhados. Se antes tínhamos as franquias, essa nova dinâmica mistura franquias, criando filmes ainda mais grandioso, tudo alavancado pelo estrondoso sucesso da Marvel. A Universal resolveu ressuscitar seus clássicos monstros que fizeram muito sucesso nas décadas de 20 e 30, através de um universo compartilhado que foi intitulado Dark Universe.
Em 2017 foi lançado “A múmia”. O filme foi um tremendo fracasso de público e crítica, causando mudanças na Universal e pondo em cheque o universo compartilhado dos monstros. “O homem invisível” chega aos cinemas com a responsabilidade de salvar essa aposta do estúdio, através de uma abordagem mais criativa e pé no chão, trabalhando temas muito atuais em uma história que tem a vítima como protagonista,
Cecilia (Elizabeth Moss) é uma mulher que vive um relacionamento abusivo com um cientista milionário e controlador, e após fugir de seu marido, ela convive com o medo permanente. Após o suicídio de seu ex-marido, ela passa a presenciar fenômenos muito estranhos que a fazem acreditar que ele está vivo e que encontrou uma forma de atormentá-la.
Escrito e dirigido Leigh Whannell (um dos criadores da franquia Jogos mortais), o filme é uma alegoria da situação que vive a mulher sobre um relacionamento abusivo, claro que com as peculiaridades da obra, mas retrata o medo constante, a perda de liberdade, o distanciamento social, os efeitos do trauma, e claro a desconfiança e descrédito que grande parte da sociedade dá a mulheres nesse tipo de situação.
A primeira metade do filme trabalha muito bem a situação, mesmo que saibamos da invisibilidade de Adrian (Oliver Jackson-Cohen), o diretor Leigh traz o vazio como elemento importante de seus enquadramentos, construindo cenas tensas onde não sabemos se o vilão está realmente presente. A construção dessa tensão acontece de forma gradativa, com cenas bem dirigidas, enquanto a tensão da protagonista cresce junto a desconfiança de seus entes queridos quanto a sanidade da personagem.
O roteiro é bem amarrado, trazendo informações que mais pra frente são usadas na história, geralmente de forma pouco previsível, em um artifício de pista e recompensa que quando bem realizado, é gratificante ao espectador. O filme traz reviravoltas que acrescentam a história e a move para novas possibilidades, já algumas delas soam gratuitas e enfraquecem o terceiro ato do longa.
Um fator que prejudica a obra é o vilão. Por mais que ele seja uma ameaça real e imprevisível, nunca conhecemos a personalidade do personagem, que poderia ser explorada através da relação de Cecilia com o ex-marido e não apenas através de diálogos. Fica estabelecido que ele era extremamente controlador e violento, mas falta um pouco mais para reforça a ameaça psicológica, principalmente na metade final do filme.
Essa metade do longa foge um pouco do suspense e do aspecto psicológico, partindo para embates diretos, alguns soando um pouco ridículos (a luta da cozinha), já algumas cenas são realmente tensas e violentas na medida certa. Os efeitos do filme são muito bons como um todo, me incomodou alguns momentos do vilão com sua vestimenta, em que fica claro o uso do efeito, muito devido a forma artificial com que ele se movimenta. São cenas em que acredito teriam um resultado muito mais eficiente, se fosse realizada de forma mais direta.
Se algo pode ser dito sobre a norte americana Elisabeth Moss (The handmaid’s tale) é que ela sabe sofrer. Mas assim como na série que a lançou ao estrelato, Moss trabalha a fragilidade de sua personagem com a mesma qualidade com que ela demonstra força e muito do sucesso do filme vêm de sua bela atuação.
“Um homem invisível” é um filme tenso, que através de um tema cada vez mais atual (infelizmente), reconta e atualiza a história do personagem título de uma forma criativa e pé no chão, mostrando o caminho que a Universal deve seguir para a construção de seu Dark Universe.