Depois de uma semana em alta temperatura que concretizou o racha na base governista na Câmara Municipal, a expectativa é por um entendimento entre Executivo e Legislativo para a votação do orçamento de 2020 antes da virada de ano. O prefeito Rafael Diniz (Cidadania) e o presidente da Casa de Leis, Fred Machado (Cidadania), alertam que o não entendimento sobre a peça orçamentária pode prejudicar o pagamento de servidores e o repasse para serviços básicos como da Limpeza Pública e para os hospitais filantrópicos. O G8 – grupo de dissidentes da base governista – cobra maior diálogo com o governo para chegar a um acordo, enquanto o Executivo diz que estuda uma solução e que está aberto à conversa.
A insatisfação entre os governistas já vinha sendo noticiada pela Folha da Manhã desde a semana anterior e foi confirmada nas sessões de terça e quarta-feira, quando o G8 se aliou à oposição e reprovou todos os oito projetos enviados pelo prefeito dentro do pacote de contingenciamento. O grupo é formado pelos vereadores Igor Pereira (PSB), Neném (PTB), Enock Amaral (PHS), Marcelo Perfil (PHS), Joilza Rangel (PSD), Ivan Machado (PTB), Paulo Arantes (PSDB) e Jorginho Virgílio (Patri).
Com grande presença de público, principalmente de servidores, que seriam atingidos por parte das medidas pretendidas pelo governo, o cenário para embates acalorados ficou evidente. Governistas e dissidentes trocaram vários ataques, aumentando a tensão entre os grupos e que chegou ao ápice na última sexta-feira com a votação do orçamento.
Mesmo com a divisão interna, o entendimento inicial era pela aprovação da peça orçamentária. Anteriormente, o G8 e a oposição também votaram favoravelmente a outros dois projetos do Executivo: o novo Plano Diretor do Município e a Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano.
Porém, o principal desentendimento entre situação e G8 aconteceu em relação a uma emenda apresentada pelo bloco e que pretendia autorizar o prefeito a remanejar as verbas do orçamento em no máximo 10% do total. Atualmente, o valor é de 30% e chegou a ser de 50% durante o governo da ex-prefeita Rosinha Garotinho.
A emenda foi considerada inconstitucional pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa e, segundo Fred Machado, não cabia discussão em plenário sobre assunto rejeitado ainda na CCJ. Foi então que integrantes do G8 se revoltaram com a situação e votaram pela reprovação.
Troca de acusações marcou última sessão
Apontado como líder da cisão, o vereador Igor Pereira (PSB) acusou o governo de fazer manobras e de pressionar os parlamentares. “Com o maior respeito que tenho pelo senhor, mas o que aconteceu nesta Casa foi uma das maiores demonstrações de falta de diálogo, falta de habilidade. Com essa queda de braço não vai chegar a lugar nenhum. O governo critica a velha política, mas fez pressão com vereador. Faz o pior que já aconteceu. Quiseram, com manobra, pressionando... Falam que não vai ter espaço para vereador. A velha política voltou”, afirmou.
Por outro lado, Rafael negou que tenha feito pressão e afirma que não faltou diálogo. “Quem me conhece sabe que sou uma pessoa que não ultrapassa os limites. Tenho até a fama com os vereadores de uma pessoa que não ameaça e trata todo mundo muito bem. Falta de diálogo não pode acontecer porque nossa gestão é a primeira a fazer Orçamento Participativo. Rodamos vários pontos da cidade para apresentar o projeto. Teve uma audiência pública na Câmara para discutir. Na minha opinião, o que houve foi uma vontade de fazer uma política irresponsável muito maior do que ter coragem para fazer aquilo que é necessário para continuar cuidando da nossa cidade”.
Vereador de oposição, Alvaro Oliveira fez coro com Igor e criticou o que chamou de falta de diálogo. “Não sei se houve racha. Pelo que eles dizem em plenário, há uma falta de entendimento. Você não pode mandar leis para a Câmara sem ouvir todos os atores envolvidos. Quem foram os atores envolvidos durante a semana? Médicos, hospitais, servidores e vereadores. Como você discute orçamento sem conversar com vereador? Pegam suas emendas, colocam na CCJ e não deixam vir a plenário. Com isso, você evita que o orçamento seja discutido e as feridas expostas”.
Líder do governo, Paulo César Genásio (PSC) acredita em uma nova sessão nesta semana. “Vamos trabalhar para uma nova sessão extraordinária, se possível nesta semana. Não existe derrotado aqui. Acho que todos perdem. Acredito que nesta semana, se Deus quiser, o orçamento vai estar aprovado em nova sessão extraordinária. Queremos dialogar. Vamos conversar com os vereadores, discutir o que é bom para o município. Não existe falta de diálogo. O governo não vai se curvar, mas vamos dialogar”.
Prefeito chama decisão de irresponsável
Com a reprovação do orçamento, a Prefeitura pode optar por judicializar o assunto ou Executivo e Legislativo também possuem a opção de dialogar e entrar em acordo. Seja qual for a via, até uma solução, o recesso parlamentar está suspenso e os vereadores precisam votar novamente a Lei Orçamentária Anual (LOA). Caso isso não aconteça até o final do ano, Prefeitura e Câmara ficam impedidas de realizar despesas a partir de 1º de janeiro e o cenário desenhado por Rafael Diniz e Fred Machado é de caos.
— A não aprovação inviabiliza as próximas despesas do ano de 2020. Considero uma tremenda irresponsabilidade o que aconteceu. A gente respeita a independência dos Poderes, mas repito: uma coisa é ser contra o prefeito Rafael Diniz, que é um direito de qualquer cidadão e também da Câmara Municipal. O que não podemos concordar é que uma peça técnica, que vai ditar as próximas despesas da Prefeitura em 2020, não seja entendida de forma técnica. Para alguns vereadores ela foi compreendida de forma política. Eu não vou aceitar o que está acontecendo, não vamos aceitar. Não se trata de um enfrentamento a um governo ou prefeito, é um prejuízo a cidade e a população — disse o prefeito, que falou, ainda, que pagamentos como salários de RPA, Limpeza Pública, hospitais contratualizado, entidades filantrópicas serão prejudicados.
Presidente da Câmara, Fred Machado pregou o diálogo e lembrou da seriedade da decisão dos vereadores.
— Essa decisão praticamente para o município. Nem o Executivo e nem o Legislativo vão poder comprar nem uma caneta. Não sei o que o Executivo vai fazer, se vai judicializar isso. Acredito que travar um orçamento de um município é de uma responsabilidade muito grande, mesmo acatando todas as decisões dos vereadores. Chamarei eles para conversar. Já me comprometi fazer essa interlocução, já que eles falam que não existe esse diálogo com o Executivo, para que a gente possa buscar esse diálogo. O que vai ter agora é um entendimento, sentarmos a mesa, conversarmos e tentarmos chegar a um acordo. Acho que o prefeito sempre foi aberto ao diálogo comigo, independente de partido. Esse entendimento chega para mim como uma forma de estreitarmos essa relação e tentarmos buscar esse diálogo.
Medidas sobre Saúde foram reprovadas
A Câmara concluiu a votação sobre o pacote de contingenciamento da do Executivo na última quarta-feira com votos em conjunto do G8 e da bancada de oposição.
Se na quarta as propostas tinham como foco os servidores, a maior parte das votadas na terça dizia respeito aos hospitais contratualizados e a área da Saúde.
Foram reprovados por maioria, com os votos da oposição e do G8, os projetos que previam as seguintes medidas: transparência e novas regras para que os hospitais contratualizados recebam os repasses do governo; mudanças na estrutura do Conselho Municipal de Saúde; criação de três Zonas Especiais de Negócio (ZEN); o que cria regras no Código Tributário para os bancos e escolas particulares; e o da reestruturação da secretaria municipal de Controle.
No dia seguinte, foram analisados os três últimos projetos do pacote do governo e que mais atingiriam os servidores da Saúde. Um deles previa controle mais rígido para concessão de auxílio-alimentação e mudava as regras para recebimento de adicional por insalubridade, enquanto o outro tratava sobre a concessão de gratificações. Além disso, também foi à votação um terceiro projeto que previa autorização para transação judicial com os cartórios da cidade, com o objetivo de aumentar a arrecadação para a área da Saúde.
No Folha no Ar, na rádio Folha FM 98,3, na última terça-feira, o presidente do Sindicato dos Médicos de Campos (Simec), José Roberto Crespo, criticou o diálogo com o governo.
— Falta colocar em prática o que a gente acorda. Esse dificuldade de assumir os compromissos tem causado revolta na categoria — afirmou.
Já o presidente Sindicato dos Hospitais, Clínicas, Casas de Saúde e Estabelecimentos de Serviço de Saúde da Região Norte Fluminense (Sindhnorte), Frederico Paes negou que os hospitais filantrópicos não sejam transparentes com as verbas públicas.
— Não nos negamos a ser transparentes. A transparência é uma obrigação. Tanto que o Ministério Público Estadual, quanto o Ministério Público Federal nos fiscalizam. A Câmara entendeu que não foi correto o projeto enviado pela Prefeitura — disse Paes, que completou: “A Prefeitura tem que olhar os hospitais como parceiros, não como problema. Nós somos uma solução barata, custa pouco para o poder público e fazemos uma administração dos hospitais eficiente com pouco dinheiro”.