Desde seus primórdios, o cinema é uma arte virtual, como, de resto, são todas as artes visuais. E esse virtualismo foi se aprimorando com o passar do tempo. A fotografia é inerente ao cinema. Os efeitos especiais também. Aos poucos, eles foram se aperfeiçoando até atingirem o estado atual, em que a figura do artista está correndo a ameaça de desaparecer.

Roland Emmerich, o mais norte-americano dos cineastas alemães, tem dado uma contribuição expressiva para a obsolescência do artista. Até agora, seus filmes primam pela ficção e, neles, o diretor cultua o cinema-catástrofe. Sempre contando com verbas vultosas para filmes supérfluos, Emmerich abusa dos efeitos especiais e mostra seus tiques como se eles constituíssem um estilo.

Agora, ele enfrenta um tema histórico que exige certa fidelidade. Sua proposta é mostrar novamente nas telas a grande batalha de Midway, travada por Japão e Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial. Em “Midway - batalha em alto mar”, Emmerich procura saltar de um roteiro de ficção para um roteiro de realidade. Não consegue com muito êxito. Primeiro, ele não soube lidar com muitos personagens principais. A caracterização deles é supérflua e pouco humana. Segundo, o excesso de cortes espaciais e temporais dilui o filme. Há personagens importantes que entram e saem de cena sem explicação. Entende-se que o enfoque dos detalhes da batalha estenderia o filme demasiadamente. Seria necessário, portanto, encontrar uma solução para esse problema.

Não apenas. Como estadunidense honorário, Emmerich caracteriza o norte-americano como corajoso, pouco disciplinado e superior aos outros povos. Da sua indisciplina, nasce o sucesso. Por mais que destaque o caráter guerreiro e disciplinado dos japoneses, a guerra foi vencida pelos melhores e superiores aos demais. Na guerra entre Estados Unidos e Japão, parte da Segunda Guerra, Clint Eastwood enfocou, de forma humana, o conflito aos olhos dos japoneses e norte-americanos em “Cartas de Iwo Jima”. Quem poderia imaginar que o artista machão iria se tornar um diretor com abordagem antropológica?

Por trás de uma medalha de condecoração por heroísmo, existe muita humanidade, muito medo, muita covardia, muita loucura, muito desespero. Parece que a medalha apaga essa humanidade, dando a impressão de que o herói foi, ao tempo todo, consciente, seguro de si, frio. Emmerich tenta mostrar o lado humano dos militares, mas não consegue o mesmo resultado de Eastwood e Christopher Nolan, em “Dunkirk”.

Por fim, a fotografia de “Midway” é extraordinária e os efeitos especiais são fantásticos. Tem-se a impressão de que a batalha sai da tela e envolve quem está na poltrona como assistente. Cineastas e espectadores de trinta anos passados não poderiam imaginar que o cinema chegaria a esse ponto. Mas nas mãos de um diretor que sempre primou pela superficialidade e pelos clichês, fotografia e efeitos especiais acabam conferindo ao filme a feição de videogame.