Daniela Abreu
26/10/2019 16:39 - Atualizado em 10/03/2020 15:03
Atafona não é mais a foz do rio Paraíba do Sul, ao menos por ora, mas, segundo as prospecções do ambientalista Aristides Soffiati, se medidas para reverter a situação não forem tomadas com urgência, a tendência é de que o local vire uma espécie de lagoa, como ocorreu em Barra do Furado e nas lagoas do Açu, Iquipari e Grussaí. O agravante é o fato dos exemplos citados não se tratarem de um rio principal e perene. Soffiati diz que, caso não se reverta, o caso será comparado ao do rio Colorado, nos Estados Unidos, que, após muitas intervenções teve a foz fechada se transformando em “uma imensa lagoa”. O avanço das areias foi mostrado em matéria publicada em agosto deste ano, quando a passagem de pescadores foi bloqueada e a solução foi a abertura de um canal. Com o fechamento, os pescadores terão acesso ao mar por São Francisco de Itabapoana, o que pode trazer reflexos para a economia local. Outra consequência da erosão em Atafona é a interdição, por tempo indeterminado, da rua Elias Gabriel Beirute, no cruzamento com a avenida Atlântica.
Sofiatti explica que já existe uma tendência de fechamento de barras na região, no entanto o que ocorre com o Paraíba não é natural:
— Barra do Furado foi aberta artificialmente há quatro séculos e ficava aberta enquanto tinha água suficiente para vazar para o mar. Quando esse nível baixava, o mar fechava a barra. A lagoa do Açu era um rio e em Grussaí, a barra fecha também. O fechamento da foz do Paraíba, no entanto, não é um processo natural porque, por mais que o rio oferecesse problemas para saída e entrada, a foz sempre esteve aberta. Era rasa, mas a água do rio fluía. Quando digo que existe uma tendência natural, estou falando de cursos pequenos.
O ambientalista recorda que se sempre houve dificuldades das embarcações entrarem ou saírem do mar para o rio. A situação foi agravada ao logo do tempo por diversos fatores que têm a ação humana como protagonista. “Antigamente, reclamavam que para entrar no Paraíba era preciso esperar a maré encher, ter ventos favoráveis. Essa dificuldade foi agravada porque desmataram e com isso temos erosão, acúmulo de areia no fundo do rio. Temos também barragens para geração de energia elétrica, o que não permite que a água chegue no volume anterior e finalmente, a transposição do rio Guandu, feita para abastecer. Com esses fatores, além da falta de chuva, o rio perdeu força”, explica.
As chuvas poderiam ser um fator amenizador para o fechamento da foz, mas, segundo o pesquisador, serão necessários grandes esforços para reverter o quadro.
— A reabertura vai precisar de volume de água, vazão. Isso se consegue primeiro reflorestando, um trabalho muito lento, assim como foi lento o trabalho até chegar a essa situação. Não digo reflorestar 100%, mas pelo menos as margens. Não cabe mais nenhuma barragem no Paraíba e, se possível, deviam tirar algumas e recriar algumas lagoas aqui na região. Algumas são cruciais para equilibrar a questão de fornecimento de água, de impedir que a língua salina penetre — pontua e ressalta que estamos entrando em estação de chuva. “Esperamos que ano que vem chova mais que em 2019 para recuperar um pouco, mas recuperar de vez, não se recupera mais, mas pelo menos a foz continua aberta e os barcos conseguirem entrar e sair”, acrescentou Sofiatti.
Ação do homem como agravante — Embora o Norte e Noroeste contabilizem a maior incidência de desmatamento no Estado, reflorestar somente a região não resolveria o grande problema de assoreamento dos rios. Soffiati aponta que as queimadas na Amazônia têm influência direta com o que está ocorrendo. “A água do Sudeste depende da evaporação da floresta Amazônica. É ali que nascem as nuvens que vão virar chuva no Sudeste, Sul e até Argentina. São os chamados rios voadores, são rios que vêm pelas nuvens, se condensam e chovem aqui na região”, explicou, lembrando como exemplo prático a chuva de cinzas em São Paulo durante o ápice da queimada na Amazônia.
O ambientalista pontua os quatro fatores que interferem diretamente no problema da foz. “Primeiro, as interferências feitas na Bacia do Paraíba, e foram muitas. Segundo, as interferências na Amazônia e terceiro as interferências no mundo inteiro e aí, aponto o aquecimento global como fator principal, porque aumenta o nível dos oceanos. Enquanto a água doce escasseia, o mar sobe de forma violenta e fecha barra de rio e produz dunas. A transposição também desvia muita água. A briga sobre isso é grande, mas tem que ser resolvido. Fica todo mundo em pânico, todo mundo reclama, mas isso não é canalizado para uma solução”, alerta o ambientalista.
Rua continua interditada na orla - Segue interditada a rua Elias Gabriel Beirute, no cruzamento com a avenida Atlântica, em Atafona, bloqueada pela Defesa Civil, há nove dias, devido à erosão costeira. Por conta do avanço do mar, parte do asfalto desmoronou. Um imóvel, na mesma rua, que era usado como comércio e moradia, também foi interditado por risco de desmoronamento. O coordenador de Defesa Civil Wellington Barreto alerta para que a população não se aproxime da área que, segundo ele, se encontra em alto nível de erosão. Até o momento, não há famílias desabrigadas e desalojadas.
A área foi isolada com manilhas e guarda corpos para impedir a passagem de carros.
— Se o tráfego for liberado naquelas vias, o asfalto vai desmoronar mais rápido devido à trepidação dos carros. Estamos informando à população por meio dos veículos de comunicação para que não se aproximem. Por enquanto, o órgão não recebeu nenhum tipo de ajuda e segue monitorando o trecho que corresponde desde a foz do Pontal até o Açu — disse e acrescentou que, atualmente, a maré está estacionada e a situação em Atafona está normal.
Quanto ao imóvel interditado, ele informou que o proprietário se comprometeu a recuar o bar 300 metros para o início de sua propriedade por entender que o ponto está sendo erodido.
A operação ocorreu no dia 16 de outubro e teve participação do setor de Postura e da Guarda Civil Municipal, que vem orientando o trânsito no local.