A implantação de um modelo de escola militar se tornou uma das pautas da Educação nos governos federal e estadual nas gestões de Jair Bolsonaro (PSL) e Wilson Witzel (PSC), iniciadas em 2019. Na última semana, o Ministério de Educação abriu as inscrições para os municípios participarem do programa que vai selecionar duas instituições de ensino em cada estado e Distrito Federal. Já o estado do Rio, que manifestou não ter interesse de fechar parceria com o programa nacional, segue com seu próprio modelo. Até o momento, a Secretaria de Estado de Educação (Seeduc), que inaugurou duas unidades, não divulgou muitas informações sobre seu projeto, mas os municípios de Campos e Miracema já confirmaram que fecharam convênio com o estado sobre o assunto. O município de Itaperuna afirmou que realizou inscrição no programa federal e São João da Barra ainda estuda propostas.
A pedagoga e pesquisadora da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), Carla Sarlo, defendeu que ainda é necessário observar como o programa vai ser implementado, mas que é importante não colocar em risco a liberdade de pensamento.
— Toda escola precisa de regras, precisamos formar valores pautados no respeito, na solidariedade, porém ter militarismo para perder a liberdade de pensamento, isso seria voltar para a época da ditadura. Não podemos permitir esse retrocesso, já que nós lutamos tanto para chegar onde chegamos. Nós precisamos evoluir e evoluir com qualidade é levar o aluno a ser protagonista e autor da sua construção de pensamento, de conhecimento, ser autônomo. O aluno para ter voz, ele tem que pensar — afirmou a pedagoga.
O programa federal chegará, em 2020, a 54 escolas, segundo o MEC. O objetivo é selecionar duas instituições de ensino em cada estado. Até o dia 11 de outubro, as prefeituras deverão solicitar participação. Podem solicitar a participação, inclusive os municípios em estados que não aderiram ao programa. A ideia é que as instituições sejam não militarizadas, mas contem com a participação de militares da reserva no papel de tutores.
O investimento do governo federal será R$ 54 milhões, sendo R$ 1 milhão por escola. O dinheiro será investido no pagamento de pessoal em algumas instituições, com a contratação de militares da reserva das Forças Armadas para trabalho nos estabelecimentos, e na melhoria de infraestrutura, compra de material escolar e reformas, entre outras intervenções. Do programa federal, podem participar escolas que atendem do 6º ao 9º ano do ensino fundamental ou do ensino médio.
Já nas unidades onde o projeto estadual foi iniciado, os colégios funcionam em horário integral e são vinculados ao Corpo de Bombeiros. Pela manhã, os estudantes têm as disciplinas da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) ministradas nas escolas de Ensino Médio Regular. No contraturno, os alunos aprendem noções de Defesa Civil; Atendimento Pré-Hospitalar (Primeiros Socorros); Prevenção e Combate à Incêndio; entre outros conteúdos. Até o momento, apenas alunos que estão entrando no ensino médio participam desse programa.
A Folha entrou em contato com o comando do 5º Grupamento de Bombeiro Militar (GBM) e do 8° Batalhão de Polícia Militar (BPM), ambos com sede em Campos, mas não responderam o contato.
Miracema vai com RJ e Itaperuna com MEC
Da região, o único município que informou qual a unidade que receberá o projeto foi Miracema. “O local escolhido pelo Coordenador do Projeto, André Monteiro, foi a Escola Municipal Sônia do Amaral. Nesta sexta-feira (4), o prefeito Clovinho Tostes, o secretário de Educação Charles Magalhães e a subsecretária de Educação Sílvia Benedicto reuniram-se com os servidores da escola para discutirem forma de minimizar os possíveis remanejamentos de servidores e alunos. Na reunião, o prefeito e o secretário de Educação explicaram que inicialmente (2020) a escola funcionará com no mínimo de 60 alunos no primeiro ano do Ensino Médio, para o ano há possibilidade de inclusão do segundo segmento. O modelo que será implementado em Miracema, embora tenham novidades, já se sabe que será bilíngue e com forte foco em áreas esportivas”, concluiu.
São João da Barra informou que a secretaria de Educação e Cultura está estudando a proposta, para ver sua adequação de acordo com a realidade do município.
Já Itaperuna afirmou que o MEC confirmou o recebimento do Termo de Adesão ao Programa Nacional da Escola Cívico-Militar (PECIM) enviado pela Prefeitura. “Com o Programa, o município tem o objetivo de promover a melhoria do ensino na educação básica, reduzir a violência, evasão e a repetência escolar, além de aumentar o vínculo dos alunos com os colegas e familiares. Itaperuna possui 36 escolas municipais com 8.599 alunos”, acrescentou.
Os municípios de Macaé, São Fidélis, Quissamã e São Francisco de Itabapoana também foram procurados, mas não se manifestaram sobre o assunto até o fechamento da edição.
Unidade em Campos ainda sem definição
Em julho deste ano, foi firmada uma parceria de Campos com o Governo do Estado para implantação de uma unidade de ensino militar. O município informou que avalia um prédio com estrutura de escola (salas, quadra esportiva e laboratório). Na última terça, o deputado federal Wladimir Garotinho chegou a afirmar que o secretário estadual de Educação pediu sua ajuda para viabilizar a implantação do modelo estadual em Campos e que, inclusive, a secretaria havia feito uma vistoria no prédio da antiga Faculdade de Filosofia de Campos (Fafic) para implantar a unidade. “Minha ajuda foi solicitada pelo secretário de Educação, pois o governo de Campos está há cinco meses para ceder um imóvel. O prédio da antiga Fafic é simbólico e estaremos resolvendo um problema crucial de uma instituição da cidade”, disse.
Questionada, a Prefeitura informou que segue os prazos definidos em reuniões com o Estado e que o projeto tem previsão de iniciar no fim do próximo ano. “É sempre mais uma possibilidade de educação, mais vagas, caminhos diferentes para que os nossos alunos, jovens do nosso município possam trilhar”, destacou o secretário de Educação Brand Arenari.
A Folha entrou em contato com a Seeduc, que não se manifestou sobre os questionamentos até o fechamento da edição.
Em funcionamento - O governador Wilson Witzel inaugurou, em junho deste ano, os primeiros colégios do Corpo de Bombeiros em Volta Redonda, no Médio Paraíba, e em Miguel Pereira, no Sul Fluminense. As unidades atendem a 120 estudantes e funcionam em horário integral. Na ocasião, o governador afirmou que tem a meta de inaugurar escolas militares em todo o estado.