(Ad Astra: Rumo às estrelas) — O espaço, sua infinitude e seus mistérios sempre foram uma alegoria poderosa com potencial para ser explorado de diferentes maneiras. Uma delas é inerente a grande parte da população que é a sensação de insignificância que algo vasto e inexplorado consegue causar.
Olhar para as estrelas em busca de respostas sobre o próprio ser humano não é uma novidade, em “Ad Astra: Rumo às estrelas”, o cineasta James Gray cria um estudo de personagem que traz o espaço e o potencial fim de tudo como pano de fundo para uma jornada intimista de autoconhecimento e reflexão na busca de um astronauta por seu pai, herói da jornada espacial, desaparecido desde sua adolescência.
O cineasta trabalha muito bem o contraste de sensações entre as paisagens imensas do espaço e a sensação de claustrofobia causada por naves com espaços apertados e trajes que só nos permitem ver os rostos dos personagens causam essa dinâmica visual interessante.
O primeiro ato é muito eficiente em estabelecer a atmosfera do filme, seu protagonista e sua relação e sentimentos em relação ao pai. A primeira vez que vemos Roy (Brad Pitt) saindo da estação espacial é uma imagem que impressiona pelo colorido e pela escala, o personagem praticamente some em meio a tudo aquilo e desde essa sequência, ele já deixa claro, que entende o espaço e se sente muito mais confortável ali que na civilização.
O filme funciona muito devido à atuação de Brad Pitt, já que o diretor cria uma abordagem visual onde o rosto do ator está sempre exposto em primeiro plano, muito disso acontece devido às cenas onde ele traja a roupa espacial e só conseguimos ver seu rosto coberto pelo capacete, mas nas cenas internas essa abordagem permanece e Pitt entrega um trabalho minimalista, pois a introspecção de seu personagem faz com que muito seja dito por suas expressões e pela eficiente narração que é dosada na medida certa.
Passado em um futuro aparentemente não tão distante, o filme busca se aproximar ao máximo da realidade nas questões espaciais e o designe de produção cria ambientes claustrofóbicos e sem vida, que não se destacam em termos de originalidade, mas ao menos funcionam nessa aproximação com o real.
O filme aborda bem de leve questões muito interessantes como a colonização dos homens na lua e em Marte, fazendo uma crítica a forma como o homem busca simplesmente reproduzir a terra em novos ambientes, seja nas construções ou mesmo nas empresas e marcas que se expandiram para estações fora da terra.
O longa tem um ritmo lento, que funciona como o tempo no espaço e ajuda nas reflexões do personagem. Ainda conta com algumas cenas de ação que parecem bem deslocadas, talvez o intuito tenha sido tornar o filme mais vendável para o público, mas essas cenas, principalmente a na órbita da lua, não tem função narrativa alguma.
Mas o tema central do filme é a busca de Roy por respostas e pelo seu pai. Conforme a narrativa evolui, começamos a entender como o protagonista na busca pelo pai, acaba se tornando muito parecido com ele. Se a obsessão do pai era descobrir vida fora da terra, a obsessão de Roy é o pai, fato que já acontecia mesmo antes da descoberta que seu pai estava vivo. O que engrandece ainda mais a missão e a jornada do personagem, que apesar de, certa forma, terem o mesmo objetivo, não poderiam ser mais diferentes.
Passando muito provavelmente pela escolha de sua profissão, Roy dedicou sua vida ao seu trabalho e sua obsessão, na busca de entender a figura paterna e inevitavelmente viver à sombra dele. Deixando para trás família e um casamento em função dessas respostas. A forma com que alguns personagens são deixados para trás pelo roteiro, são mais um indício de como o personagem não consegue enxergar o mundo além da sua procura e a escolha de atores com um certo nome para personagens pequenos, é essencial para reforçar essa sensação.
O terceiro ato traz respostas. Algumas podem não agradar a maioria, mas assim como o restante da obra, as respostas são sutis e funcionam no arco dramático do personagem. Um diálogo em especial muda toda a percepção do pai, vivido por Tommy Lee Jones, uma cena singela, mas que fica na cabeça do espectador que comprou a jornada do protagonista.
“Ad Astra: Rumo às estrelas” é um filme espacial que busca respostas para questões bem mundanas. A jornada de Roy em busca do pai poderia acontecer em diversos outros cenários, mas a imensidão do espaço é perfeita para estimular as reflexões e sentimentos do protagonista. Não por acaso ele busca no exterior e no desconhecido as respostas para conflitos tão internos, nessa que é uma das características mais humanas que poderemos encontrar em nós mesmos.