(Cemitério maldito) — Sabendo que uma nova versão de “Cemitério maldito” estava a caminho, decidi reassistir aos dois primeiros filmes inspirados no tenebroso livro de Stephen King, talvez o maior mestre do terror verdadeiro. Mary Lambert não foi feliz na direção das duas primeiras versões cinematográficas do conto. Expresso aqui minha opinião pessoal sobre o terceiro filme, que não pretende ser continuação dos dois primeiros na forma de franquia. É uma tentativa de aproveitar o tema de forma mais competente. Entendo que deu certo.
Os clichês são inevitáveis num gênero superexplorado, notadamente nos Estados Unidos. Um casal com dois filhos que, fatigado da cidade, decide morar no campo. Ele é um médico cético e ateu. Ela crê no transcendental, mas carrega um grande sentimento de culpa em relação a sua irmã morta. A nova residência do casal fica na beira de uma autoestrada movimentada que contrasta com a floresta ao fundo. O movimento de veículos pesados defronte à casa prenuncia perigo. A floresta ao fundo idem, pois florestas temperadas na linguagem do terror é a mansão de espíritos. Por fim, um velho solitário vizinho dos novos moradores. Ele também carrega um passado sombrio relacionado a sua falecida mulher.
Logo de início, uma procissão de crianças mascaradas de bichos passa atrás da casa em direção a um cemitério de animais. Pouco adiante do piedoso cemitério, uma barreira de paus e pedras. A filha mais velha do casal tenta transpô-la, mas é dissuadida pelo velho. Além dela, saber-se-á mais adiante, existe um cemitério em terras amaldiçoadas. Elas foram cercadas pelo grupo indígena que habitou o lugar outrora e o abandonou. Mais um contraste: o médico ateu representa o profano e as terras interditadas pelos índios representam o sagrado.
O gato querido da menina é encontrado morto, talvez atropelado por algum veículo na autoestrada. Sabendo que a menina o adorava, o velho propõe ao médico devolver a vida ao animal, enterrando-o nas terras proibidas. Um aviso misterioso já havia sido dado ao médico para não ultrapassar a barreira construída pelos índios. As terras malditas do cemitério têm a propriedade de ressuscitar os mortos. Mas eles nunca serão os mesmos. Na verdade, eles não retornam à vida. São apenas zumbis conscientes com grande capacidade de urdir o mal, de matar os vivos, de também transformá-los em zumbis. O velho quis fazer um bem e gerou males. Apenas esse contraste não convence: o velho sabedor do perigo das terras usa-as no intuito de agradar uma menina.
As mortes começam a se suceder. A estrada inicia o ciclo macabro. O médico não se torna propriamente um crente, mas um usuário do cemitério maldito como se lidasse com um brinquedo de ressuscitação. Sua mulher, crente, demonstra que não há retorno para os mortos de forma simples, que vida e morte não são um brinquedo.
O novo “Cemitério maldito” ganhou roteiro enxuto de Jeff Buhler a partir do livro de Stephen King, e direção sóbria da dupla Kevin Kölsch e Dennis Widmyer. O elenco não conta com nomes famosos e corpos belos, como costuma acontecer em filmes de terror, com raras exceções. Bastam artistas que saibam atuar.