Por menos original que seja, não dá para fugir do velho clichê: a política do Brasil seria cômica se não fosse trágica.
Num ano de importância fundamental para o futuro do País, estratégico sob vários aspectos, em que cada hora deveria estar recebendo o máximo de aproveitamento, o que se vê é uma série interminável de sandices e 70 dias praticamente perdidos.
Fechando – literalmente – o carnaval de tolices, o vídeo obsceno divulgado pelo presidente Jair Bolsonaro, publicado em sua conta pessoal no Twitter, que deixou tanto opositores como apoiadores com os respectivos queixos caídos.
De certo que Bolsonaro desejou chamar atenção para excessos e abusos não raro cometidos no carnaval. Mas não poderia ter sido mais infeliz na forma escolhida: o uso de obscenidade explícita para combater baixaria. Em suma, deu larga divulgação ao que desejou rechaçar, abrindo enorme porta de entrada ao que não devia ser mostrado.
Além do que, cenas de escabrosa promiscuidade não devem ser tomadas como padrão da folia brasileira, mas como exceção.
Paralelamente, o presidente ainda deu munição de sobra à oposição e desafetos, quando generalizou, advertindo que não se sentia confortável em mostrar, “mas temos que expor a verdade para a população ter conhecimento e sempre tomar suas prioridades”. E arrematou: “É isto que tem virado muitos blocos de rua no carnaval brasileiro”.
Para ser pior do que foi, só se dissesse que se sentia confortável.
Compulsividade nas redes sociais
Para que o governo brasileiro esteja alinhado com os Estados Unidos – entendendo-se ser esse o caminho que melhor expresse os interesses do País no cenário internacional – o presidente Bolsonaro não deve copiar Donald Trump naquilo que o chefe de Estado americano é mais criticado: os tuítes recheados de baboseiras.
Além do que, o fato do candidato Bolsonaro ter usado as redes sociais como principal ferramenta de comunicação em sua vitoriosa campanha, não justifica que, agora presidente, mantenha a mesma postura. A Presidência da República tem seus ritos próprios e a liturgia do cargo recomenda que protocolos sejam seguidos. Afinal, não fala mais por si, mas pelo Brasil.
É curioso observar que particularmente os ministros militares devem estar de cabelo-em-pé com a compulsão de Bolsonaro em falar demais nas redes sociais e, no geral, com a impulsividade dos ‘filhos presidenciais’ de darem ou seguirem o exemplo. Vá lá saber!
De toda forma, resta evidente que o presidente do Brasil deveria ter mais o que fazer do que passar o carnaval assistindo e postando vídeos na Internet.
Congresso teve 12 dias de folga
Parece que o melhor para o Brasil seria começar 2019 de novo e fazer de conta que o ano começa amanhã, 11 de março.
Assim, poderíamos passar por cima de um fato que, parecendo fantasia, foi a pura realidade: os deputados e senadores tiveram 12 dias de carnaval. Basta contar. Para a população brasileira, o carnaval começou sábado e prosseguiu domingo, segunda e terça. Na quarta, ao meio dia, quase todos ‘os mortais’ voltaram ao trabalho. A soma dá 4 dias e meio. Mas, para os ilustres parlamentares, o período de feriado foi 3 vezes maior, com o ‘recesso’ iniciando na 5ª-feira, 28, e retorno só na terça-feira, 12 de março. Doze dias!
Entre o ridículo e o constrangedor
Em outro cenário, que já pertenceu à pauta política e hoje está na área policial, o ex-governador Sérgio Cabral, preso e condenado a 200 anos de prisão, antecipou um pouquinho o carnaval com sua declaração de verdade: “Em nome da minha mulher, da minha família e da história, decidi falar a verdade. Hoje sou um homem muito mais aliviado”. Algo entre o alegórico e o emocionante. Na dúvida... lembrando aquele antigo programa da Globo, “Você Decide”!
Na sequência do constrangedor vídeo postado por Bolsonaro (espera-se que ministros e auxiliares próximos tenham alertado o presidente que cada gesto seu tem repercussão mundial, afetando positiva ou negativamente a imagem do Brasil), vieram as manifestações sugerindo impeachment.
Reconheçamos, não faltava mais nada. O Brasil entender impeachment como regra, não como exceção, citando a “honra do cargo”. Ainda bem que corrente majoritária de juristas logo se manifestou, lembrando que o post, muito embora infeliz, não sustenta tal pedido e não atinge a dignidade do cargo.
O presidente Bolsonaro errou na maneira e forma de se expressar, mas não apoiou obscenidade. Ao contrário, quis combatê-la. Exibiu o vídeo como advertência, como cena absurda, e chegou a exagerar ao dizer “...mostrar a verdade para a população ter conhecimento...”. Afinal, não é “a realidade”, mas um episódio incomum.
Enfim, restou evidente o contrassenso da postagem e, mais evidente ainda, que inconsequentes de plantão, os opositores que apostam no ‘quanto pior, melhor’, tenham falado em impeachment por motivo tão fútil.