Matheus Berriel
26/02/2019 19:19 - Atualizado em 01/03/2019 18:19
A pouco mais de um ano de completar um século e meio de existência, a Sociedade Musical Lyra de Apollo continua sendo reestruturada. O passo atual da reforma é a recolocação das liras no alto do centenário prédio, atingido por um incêndio em 1990. Desde o dia 16, a primeira já pode ser vista na torre direita por quem passar pala praça do Santíssimo Salvador, no Centro de Campos, enquanto a segunda foi instalada no último sábado (23), na torre esquerda. As liras são feitas de zinco, com 3 metros de altura e 80 quilos, cada. Os ajustes finais serão realizados até a próxima semana.
— O prédio não tinha as liras desde o incêndio. Elas estão sendo colocadas agora, dentro do projeto de restauração. As liras foram feitas por João Batista Teixeira, um restaurador do Rio de Janeiro, baseado no projeto antigo a partir de fotos. Isso tem uma importância grande, porque você vê que está voltando à realidade. É emocionante — disse o maestro Ricardo de Azevedo, presidente da Lyra de Apollo desde 2008.
A ligação de Ricardo com a sociedade musical é marcante. Ele ingressou na banda há mais de seis décadas, quando tinha apenas 13 anos. Atualmente, está com 79, tendo visto músicos de várias gerações passarem pelo grupo.
— A Lyra de Apollo faz parte da história do Brasil. A passagem histórica da banda é muito importante, não representa só a história de Campos. Por aqui, passaram nomes importantes, como os regentes Etienne Samary e Álvaro de Andrade Reis, o Loquinha, e outros grandes personagens, músicos daqui que atuaram muito no Rio de Janeiro, como José de Miranda Pinto, “Satyro” Silva, uma série de profissionais — afirmou Ricardo.
Antes do nascimento do atual presidente, já havia tocado triângulo na Lyra de Apollo o então garoto Wilson Baptista, nascido em Campos, que viria a se tornar um dos maiores sambistas brasileiros de todos os tempos, contemporâneo de Noel Rosa, Cartola e Ismael Silva. O também sambista Délcio Carvalho, grande parceiro de Dona Ivone Lara, foi outro artista de peso com passagem pela sociedade, onde fui aluno de Etienne Samary.
A reforma do prédio histórico, tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac), começou em 2012. Desde então, já foi gasto aproximadamente R$ 1 milhão, com destaque para a reconstrução do assoalho e da escada, possibilitando o retorno das aulas de música e dos ensaios ao local, ambos aos sábados. O valor destinado à reforma foi obtido por meio do aluguel de um ponto comercial pertencente à banda, além de dinheiro do próprio Ricardo de Azevedo e de outros integrantes.
— A base de sustentação está sendo feita através do aluguel do ponto comercial. Temos outro ponto que está fechado, porque também precisa de reforma. Ainda falta muita coisa para concluir a obra (do prédio da Lyra), inclusive muito dinheiro. Agora, temos que fazer a fachada do prédio e o projeto de incêndio, que são duas coisas cruciais. A banda vai fazer 149 anos no dia 19 de maio. Seria bom se nós ganhássemos de presente um projeto de incêndio, que é caro e não temos condições de fazer no momento. O prédio está tombado como patrimônio estadual, é patrimônio cultural do município, mas não temos ajuda de ninguém, tudo está sendo feito com dinheiro nosso — lamentou o maestro.
Uma das críticas de Ricardo foi sobre a falta de apoio por parte do poder público: “A gente sempre tem contato com a secretaria de Cultura, mas nunca houve sinalização de nada”. Em nota, a Prefeitura informou que o prédio é propriedade particular. Desta forma, “é impedida de realizar quaisquer intervenções. O prédio se enquadra e é beneficiado pela lei 8,487, que permite que o poder público municipal, com a concordância do Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural (Coppam), reduza o IPTU e outros impostos municipais dos bens imóveis tutelados, protegidos/preservados e/ou tombados sempre que for indispensável à manutenção do bem. Conforme previsto nos parágrafos 1º e 2º da lei, a redução não pode ultrapassar 80% do valor do imposto e este benefício está condicionado à preservação do bem tutelado, protegido e/ou tombado. A Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima está aberta para diálogo junto aos diversos segmentos”.
Atualmente, 28 músicos fazem parte da Lyra de Apolo, que se apresentou pela última vez no dia 20 de janeiro, em Barra do Itabapoana, durante os festejos de São Sebastião. Hoje, haverá uma apresentação durante evento carnavalesco no Sesc Campos, a partir das 18h. Uma agenda será montada até o 149º aniversário.
— Espero que as pessoas apareçam para doar alguma coisa, porque nós estamos muito necessitados. Torço para que meu pedido toque nos corações dos empresários campistas e do prefeito, para que eles dêem alguma coisa para a gente — afirmou Ricardo, que entende a música como algo divino: — Música é cultura, uma coisa muito importante, que vem de Deus. Quando você ouve uma boa música ou toca um bom instrumento, está transmitindo uma mensagem e falando com Deus.