Lava Jato prende 10 deputados no Rio
08/11/2018 21:19 - Atualizado em 12/11/2018 16:00
Uma ação conjunta do Ministério Público Federal (MPF) e Polícia Federal (PF) levou à cadeia, nesta quinta-feira, sete deputados estaduais do Rio de Janeiro, além de mais três que já encontravam-se custodiados. Também foi preso o secretário estadual de Governo, Affonso Monnerat, que pediu exoneração, além de assessores que atuavam na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). O presidente do Departamento de Trânsito (Detran/RJ), também exonerado, Leonardo Silva Jacob, e seu antecessor Vinícius Farah, recém-eleito deputado federal pelo MDB, se entregaram à polícia durante a tarde desta quinta. A Operação Furna da Onça é desdobramento da Cadeia Velha e foi desencadeada pela Força-tarefa da Lava Jato para investigar a participação de deputados estaduais do Rio em esquema de corrupção, lavagem de dinheiro e loteamento de cargos públicos e mão de obra terceirizada. De acordo com o superintendente da Polícia Federal, Ricardo Saadi, o esquema teria movimentado R$ 54 milhões e o “mensalinho” a deputados variava entre R$ 20 mil e R$ 900 mil. O governador Pezão (MDB) não é investigado, de acordo com as autoridades.
A PF prendeu os deputados André Correa (DEM), líder do Governo na Alerj, Chiquinho da Mangueira (PSC), Coronel Jairo (MDB), Luiz Martins (PDT), Marcelo Simão (PP), Marcos Abrahão e Marcus Vinícius “Neskau” (PTB). Tiveram nova prisão decretada os ex-presidentes da Alerj, Jorge Picciani e Paulo Melo, além de Edson Albertassi, os três do MDB. Nove assessores e auxiliares também foram presos, além de funcionários lotados do Palácio Guanabara e no Detran.
A PF prendeu, ainda, a diretora de Registros do Detran Carla Adriana Pereira, a atual subsecretária na Secretaria de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Social, Shirlei Aparecida Martins da Silva e Jennifer Souza da Silva.
De acordo com a investigação, que foi iniciada em 2011 e terminou em 2014, a organização criminosa era chefiada pelo ex-governador Sérgio Cabral (MDB), preso desde novembro de 2016. Pelo esquema, deputados estaduais eram pagos para que patrocinassem interesses do grupo criminoso na Alerj.
Ainda segundo as investigações, Cabral teria criado um fundo único onde o dinheiro era depositado. Em caso de necessidade de interferir em votações — aprovar ou não — eles pagavam para algum parlamentar. Paulo Melo e Picciani, no entanto, recebiam a propina mensalmente, segundo a PF. A força-tarefa afirma que o esquema continuou mesmo após Picciani, Melo e Albertassi serem presos, no ano passado.
As prisões ocorreram em sessão secreta no último dia 25, quando cinco desembargadores da 1ª Seção Especializada do TRF-2 assinam os 22 mandados de prisão - o único a não assinar dos seis integrantes estava em licença médica. O relator, desembargador Abel Gomes, nem precisou ler o voto para ser acompanhado pelos demais colegas.
Alerj não poderá revogar prisões decretadas
O procurador da República Carlos Aguiar afirmou, em entrevista, que a Assembleia Legislativa não poderá votar a revogação da prisão dos 10 deputados, como fez, ano passado, visando soltar Jorge Picciani, Paulo Melo e Edson Albertassi, alvos da operação Cadeia Velha.
Aguiar explicou que a prisão foi decidida em colegiado por desembargadores do TRF-2, o que impede a votação.
Aguiar também fez duras críticas aos integrantes da Alerj que foram a favor da soltura dos caciques do partido do governo: “Esses deputados tiveram uma postura clara de defender os colegas presos. Essa decisão não precisa ser levada à Alerj porque não é uma decisão monocrática e sim tomada em um colegiado por cinco desembargadores. Os antecedentes justificam o motivo de não levar a votação à Alerj. Ao invés de votarem pela cassação, votaram pela liberdade dos parlamentares. O Chiquinho (da Mangueira) faz parte da corregedoria e da Comissão de Ética e ele não se moveu junto, com os seus pares, para cassar o mandato dos outros deputados. Isso mostra que eles ficaram preservando os colegas”, criticou.
Na decisão que pediu as prisões, o desembargador federal Abel Gomes também reforçou que elas, por serem preventivas e de natureza judiciais, não poderiam ser revogadas. À Alerj, destacou, cabe apena atuar sobre outras questões, como abrir processo ético-disciplinar, o que nunca aconteceu desde as prisões da operação Cadeia Velha.
“Propinolândia” com efeitos desastrosos
Uma “propinolândia”. Assim referiu-se à Assembleia Legislativa do Estado o procurador regional da República, Carlos Aguiar: “Essa organização é ainda atual e causa efeitos desastrosos ao Rio”, afirmou. “Infelizmente, obtivemos provas de um sistema de corrupção desde o ex-governador Cabral que estabeleceu uma relação de promiscuidade de ‘toma lá da cá’ para que os deputados atuassem no interesse dessa organização criminosa”, completou.
Ele ainda ressaltou: “Não estamos investigando deputados ou Alerj, e sim pessoas que se valiam de cargos para perpetuar seus poderes políticos. Eles lotearam o Rio em uma fatia de bolo e fizeram isso com um esquema de pagamento de dinheiro em espécie de propina”, concluiu.
Para o superintendente da Receita Federal da 7ª Região, Luiz Henrique Casemiro, a organização agia com a certeza da impunidade e nem usava apelidos: “Chiquinho recebeu, entre dezembro de 2013 e fevereiro de 2014, R$ 3 milhões em propina para ser usado no carnaval da Estação Primeira de Mangueira”, acrescentou.
Pezão aceita exoneração de secretário preso
O governador Luiz Fernando Pezão divulgou nota, na noite de sta quinta, onde aceita o pedido de exoneração do secretário de Governo, Affonso Monnerat. De acordo com a nota, Pezão “determinou a exoneração dos demais servidores citados na operação hoje realizada, Carla Adriana Pereira, Shirley Aparecida Martins da Silva e o presidente do Detran, Leonardo Jacob. O governador reitera que não tem conhecimento dos fatos e tampouco do teor das acusações imputadas a esses servidores. O governador reafirma sua confiança na inocência do ex-secretário Affonso Monnerat”.
Ao chegar à prisão, o deputado André Correa afirmou que “quem não deve não teme”. A assessoria de Vinícius Farah divulgou nota: “O sr. Vinicius Farah confia na Justiça e afirma que a situação será devidamente elucidada. Ele já se apresentou às autoridades em Brasília para os devidos esclarecimentos”. A Alerj não se manifestou.
Quem são os políticos presos
Jorge Picciani (MDB)
“Mensalinho”: R$ 400 mil/mês*
Foi eleito deputado estadual pela primeira vez em 1991 e passou pelas secretarias estaduais de Esporte e Lazer e presidência da Suderj em 1993, no governo de Leonel Brizola. Se aliou com o então deputado Sérgio Cabral desde 1995. Em 2003 se tornou presidente da Alerj pela primeira vez, cargo que ocupou até 2010, quando se candidatou ao Senado e perdeu. Voltou à cadeira em 2014 e chegou a ser preso durante a operação Cadeia Velha, há um ano. Atualmente está em regime de prisão domiciliar para tratar um câncer na bexiga.
 
Paulo Melo (MDB)
“Mensalinho”: R$ 900 mil/mês*
De Saquarema, na Região dos Lagos, Paulo Melo foi vereador em 1988 e chegou à Alerj pela primeira vez em 1990, onde presidiu a CPI do extermínio de menores, no mesmo ano, e a CPI do Propinoduto, em 2003, que investigou esquema de corrupção na secretaria estadual de Fazenda. Foi presidente da Casa entre 2010 e 2015, quando brigou com Picciani, e secretário de Governo de Luiz Fernando Pezão, mas retornou ao Legislativo após a crise do Estado. Está preso desde o ano passado após a operação Cadeia Velha.
Edson Albertassi (MDB)
“Mensalinho”: R$ 80 mil/mês, além de R$ 1 milhão para campanha eleitoral em 2014*
Já foi vereador em Volta Redonda e eleito deputado estadual mais votado da região em 1999. Ficou conhecido através de uma rádio evangélica e, desde então, passou a ser proprietário de outras empresas de comunicação. Era líder do governo na Alerj quando foi preso junto com Picciani e Melo, e postulante a uma vaga vitalícia no Tribunal de Contas do Estado (TCE). Seu nome chegou a ser aprovado para o cargo, o que apressou a operação Cadeia Velha.
Chiquinho da Mangueira (PSC)
“Mensalinho”: mais de R$ 3 milhões que foi usado para desfile da escola de samba da Mangueira*
Reeleito em outubro, o deputado também é presidente da Mangueira e corregedor parlamentar da Alerj, responsável por investigar inquéritos contra colegas. Foi acusado de envolvimento com traficantes em 2003, mas absolvido pela mesa diretora da Casa. Também foi secretário municipal de Esportes do então prefeito do Rio Eduardo Paes, entre 2009 e 2010, além de presidente da Suderj, entre 1999 e 2006, e secretário estadual de Esporte, entre 2003 e 2006.
André Corrêa (DEM)
“Mensalinho”: R$ 100 mil/mês*
Já se considerava candidato à presidência da Alerj em 2019, pela qual realizava articulações nos bastidores. Reeleito para o quinto mandato, teve a sétima maior votação em outubro. Corrêa foi secretário de Meio Ambiente de Pezão, entre 2015 e 2016, cargo que já havia ocupado entre 1999 e 2002. André também ficou conhecido por uma cena inusitada. Ele chegou a mergulhar na Baía de Guanabara para mostrar que a água supostamente estava limpa e pronta para receber as provas da Olimpíada de 2016.
Coronel Jairo (MDB)
“Mensalinho”: R$ 50 mil/mês, além de ajuda financeira para campanha eleitoral*.
Eleito pelo MDB, o coronel da Polícia Militar já foi comentarista esportivo e se arriscou na poesia ao escrever o livro “Pedaços de Vida”. Jairo tem como seu reduto eleitoral a Zona Oeste do Rio e é um dos nomes importantes de outra escola de samba, a Mocidade Independente de Padre Miguel. Está no quarto mandato, mas não conseguiu a reeleição. Chegou a ser vice-presidente da Casa Legislativa e presidiu várias sessões nos últimos anos.
Luiz Martins (PDT)
“Mensalinho”: R$ 80 mil, além de R$ 1,2 miçhão para a campanha eleitoral em 2014.
O deputado estadual Luiz Martins é atualmente o líder do PDT na Alerj e conseguiu a reeleição com mais de 38 mil votos em outubro. Chegou à Casa pela primeira vez em 2010 e relatou a CPI das Armas em 2016. No ano passado, a imprensa mostrou que o parlamentar foi um dos beneficiados com doações de campanha feitas pelo então presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Jorge Picciani.
Marcelo Simão (PP)
“Mensalinho”: R$ 20 mil/mês*
Natural de São João de Meriti, na Baixada Fluminense, onde possui seu reduto eleitoral, o deputado Marcelo Simão foi vereador por três mandatos, de 1997 a 2007, mas renunciou ao cargo para se candidatar e vencer o pleito para a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Foi expulso do PSB e passou pelo PMDB e PHS antes de chegar ao PP. Simão também foi candidato à Prefeitura de Meriti, mas não teve êxito. Está no segundo mandato na Alerj, mas não foi reeleito.
Marcos Abrahão (Avante)
“Mensalinho”: R$ 80 mil por mês, além de R$ 1,5 milhão para a campanha eleitoral em 2014
Com reduto eleitoral em Rio Bonito, na Região Metropolitana, Abrahão foi reeleito para o quinto mandato como deputado (2003-2018), foi sargento da Polícia Militar, onde entrou na década de 1980. Em sua descrição no site da Alerj, diz que “se caracteriza principalmente pelo dinamismo e lealdade aos seus companheiros”. A imprensa mostrou também que Abrahão é o deputado mais faltoso da Casa. Em 2014, foi denunciado como mandante do homicídio.
Marcus Vinícius Neskau (PTB)
“Mensalinho”: R$ 50 mil/mês*
Oriundo de Barra do Piraí, no Sul Fluminense, o deputado do PTB é conhecido como “Neskau” e foi reeleito para o quarto mandato (2008-2018). Foi secretário de Estado de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida na gestão de Sérgio Cabral, depois de cumprir um mandato como deputado estadual. Atualmente, o parlamentar ocupa o cargo de terceiro vice-presidente da Alerj e presidente regional do PTB no Rio de Janeiro. Em novembro do ano passado votou a favor da revogação da prisão dos deputados presos na operação Cadeia Velha.
Vinícius Farah (MDB)
“Mensalinho”: não informado
Ex-presidente do Detran, Farah foi eleito deputado federal pelo MDB neste ano com 57.707 votos. Natural de Três Rios, foi vereador da cidade e depois prefeito por duas vezes. Conforme interceptação telefônica, foi indicado ao cargo pelo deputado estadual Picciani, com referendo do deputado estadual Paulo Melo e garantiu a manutenção do esquema ilícito de distribuição de cargos no âmbito do Detran, segundo a Polícia Federal.
Affonso Monnerat - Secretário estadual de Governo
“Mensalinho”: não informado
Monnerat foi chefe de gabinete do Governo do Rio de Janeiro em 2016 e prefeito da cidade de Bom Jardim. Ele compõe a Comissão de Transição Governamental de Pezão para o governador eleito Wilson Witzel (PSC). Em 2012, o MPF propôs ação de improbidade administrativa por irregularidades na contratação de empresas para reconstrução de pontes destruídas na tragédia de janeiro de 2011 na Região Serrana. Ele aparece na planilha apreendida na operação Cadeia Velha como detentor de cinco postos no Detran.
Leonardo Jacob - Presidente do Detran
“Mensalinho”: não informado
Foi secretário de Governo e Planejamento em Três Rios durante a gestão de Vinícius Farah, seu antecessor na presidência do Detran. Segundo a investigação, o acusado assumiu o comando do Detran e contratou sem licitação, de forma ilícita, a empresa Probid, sucessora dos serviços de terceirização de mão de obra prestados pelo Grupo Facility/Prol na autarquia. Ele também teria participado da operação que ajudou a manter o esquema de corrupção aos parlamentares. (S.M.) (A.N.)

ÚLTIMAS NOTÍCIAS