Wagner Schwartz na Bienal
Matheus Berriel 14/11/2018 20:40 - Atualizado em 16/11/2018 17:13
A vinda do artista plástico Wagner Schwartz a Campos para participar da 10ª Bienal do Livro, na próxima semana, virou o principal assunto nas redes sociais de grande parte da população campista. Isto porque pessoas ligadas a um movimento de direita existente na cidade usaram o Facebook para cobrar o cancelamento do convite da organização ao performer, sob ameaça de protestos. Por outro lado, a Prefeitura confirmou que não haverá mudança na programação. Polêmicas em torno da figura de Wagner acontecem desde setembro do ano passado, quando este realizou uma performance no Museu de Arte Moderna de São Paulo e, estando nu na atração, foi tocado por uma menina de seis anos, acompanhada no evento pela mãe. Na época, o artista foi vítima de linchamento virtual. Em fevereiro, o Ministério Público Federal descartou o crime de pornografia infanto-juvenil e pediu o arquivamento da investigação.
No início desta semana, um professor do Instituto Federal Fluminense (IFF), instituição que vai sediar a Bienal, e também pastor evangélico, ligado ao movimento de direita, publicou no Facebook um vídeo fazendo campanha de boicote ao evento. No vídeo, o autor considera que, sustentando a ideia de fomento de promoção à leitura, a Bienal tem uma programação voltada a fomentar uma agenda da esquerda, com apoio do prefeito Rafael Diniz (PPS). Após a repercussão, o vídeo foi deletado. Posteriormente, o perfil do professor saiu do ar.
O reitor do IFF, Jefferson Manhães, entendeu o posicionamento do docente como uma opinião pessoal. “Apesar de discordar frontalmente e de estar muito preocupado com este novo ‘modus operandi’ que vem se difundindo ultimamente, é o direito que ele tem de se manifestar. Em nenhum momento ele se identifica ou menciona nossa instituição”, disse Jefferson.
Ontem, outro membro do movimento de direita fez campanha contra a Bienal no Facebook. Desta vez, um jovem, cujas iniciais do nome batizam o grupo, gravou vídeo criticando o convite feito pela Prefeitura a Wagner Schwartz, a quem chama de “charlatão, sem vergonha do MAM” e “pedófilo”, bem como a outras pautas classificadas como “de esquerda”, entre elas as discussões sobre racismo e homofobia, que estarão presentes em outras mesas temáticas. A exemplo do anterior, o vídeo também foi retirado do ar.
Em comunicado nas redes sociais, o grupo de direita reivindicou o cancelamento do convite a Wagner. E ameaçou que cobraria isso da Prefeitura em forma de protesto, impossibilitando que a Bienal seja realizada. O conteúdo da postagem foi compartilhado por diversas pessoas em grupos de Whatsapp.
Questionada sobre a situação, a presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL), Cristina Lima, confirmou a realização da Bienal e a presença de Wagner. “Nós estamos muito seguros do que queremos e confiantes de que a população entendeu a mensagem da Bienal, a mensagem da diversidade, de respeito às livres formas de expressão”, disse Cristina, saindo em defesa de Wagner. “Protestar é um direito legítimo de toda pessoa, desde que a forma de protesto seja aceitável, que não interfira no direito do outro. Bienal é isso mesmo. Não pretendemos fazer uma Bienal que dê receita de bolo. Pretendemos uma Bienal que discuta assuntos que estão colocados na sociedade. Então, estamos tranquilos e certos de que estamos no caminho correto”, completou.
Wagner Schwartz será um dos debatedores da mesa “Fakenews: Mentiras Verdadeiras”, às 17h do dia 23 (sexta-feira). O debate também contará com os jornalistas Artur Xexéo, Cláudia Eleonora e o diretor de redação da Folha da Manhã, Aluysio Abreu Barbosa, tendo Ocinei Trindade como mediador. Na véspera, às 19h, o artista lançará seu livro “Nunca Juntos mas ao Mesmo Tempo”. A reportagem tentou contato com Wagner, sem êxito. De acordo com sua produtora, o artista estava num compromisso em Porto Alegre.
Artur Xexéo comentou a polêmica. “Me parece, pessoalmente, que é um protesto antigo. Não consigo imaginar o porquê de, em pleno século XXI, estar se discutindo uma nudez como performance artística, se ela é adequada ou não. Acho que existe nudez em performances artísticas desde sempre, ou num quadro dos impressionistas, ou como performance mesmo a partir dos anos 1960. Se tivesse uma repercussão nos anos 1960 do século passado, eu entenderia. Hoje, eu não entendo”, afirmou o jornalista. Para Xexéo, tratar o ocorrido durante a performance de Wagner não tem fundamento e se configura fake news, justamente o tema da mesa para qual o artista foi convidado.
— É um radicalismo até boçal falar nisso. Você protestar contra o ato, protestar contra a manifestação artística, faz parte do jogo da democracia. A democracia tem que ter todos os lados. Mas, até que ponto vale esse protesto? Você tentar impedir que uma pessoa participe de uma mesa de debate porque ela tem essa história no seu currículo artístico, aí não dá para aceitar. Isso não é democrático, é antidemocrático. (...) O mal da fake news, hoje, é que as notícias são desmentidas e o boato continua. Isso que é difícil de aceitar — completou Xexéo.

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