Estresse na gravidez traz prejuízo ao bebê
- Atualizado em 13/11/2018 18:25
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A gravidez é um dos períodos em que a mulher precisa ter mais atenção à saúde, com acompanhamento contínuo de especialistas e atenção redobrada com a alimentação e a forma física para garantir o seu bem-estar e o do bebê. Além da cautela em relação ao corpo, um cuidado que acaba passando desapercebido tem se mostrado cada dia mais fator extremamente importante: a saúde emocional.
Cientistas mostram, em uma série de pesquisas recentes, que traumas sofridos na gestação e durante os primeiros dias de vida podem influenciar no surgimento de transtornos de humor e de ansiedade nas crianças. Segundo investigadores, é possível usar os dados desses estudos para ajudar na prevenção de enfermidades psicológicas durante a idade adulta.
O estresse e seus efeitos em recém-nascidos foi um dos temas de discussão da reunião anual da Sociedade de Neurociência, realizada, em San Diego, nos Estados Unidos. Durante o evento, pesquisadores da Universidade de Ohio apresentaram um estudo que ajuda a explicar por que essa condição de tensão excessiva no início da vida pode influenciar negativamente a saúde mental.
Os cientistas analisaram o papel dos mastócitos, uma célula extremamente importante no desenvolvimento humano. “Essas são células imunes envolvidas em reações alérgicas que, historicamente, foram amplamente ignoradas por neurocientistas, mas agora estamos descobrindo, em modelos de roedores, que podem ser responsáveis por algumas das mudanças que vemos no neurodesenvolvimento após um trauma na infância”, detalha Kathryn Lenz, autora principal do estudo e professora-assistente de psicologia na Universidade de Ohio.
Os pesquisadores compararam ratos estressados com cobaias não estressadas, considerando também diferenças em relação ao sexo dos animais. O grupo de Lenz observou efeitos do estresse durante os primeiros dias de vida, como ser deixado sozinho, sem a mãe, por longos períodos. “A exposição crônica ao estresse fez com que víssemos diferenças significativas na atividade dos mastócitos no cérebro”, explica Lenz.
Segundo a pesquisadora, nos testes, os animais que mais sofreram com a tensão extrema no início da vida apresentaram 30% mais mastócitos do que os não estressados. O aumento dessas células é preocupante porque elas liberam histamina, uma substância química geralmente associada a reações alérgicas, que poderiam alterar o desenvolvimento do cérebro.
O amento foi maior nos machos, e os pesquisadores explicam que essa diferença é interessante porque há evidências de que, em humanos, os homens podem ser mais vulneráveis a problemas de saúde decorrentes de traumas na primeira infância. “Essas situações, como viver em um lar abusivo ou ser negligenciado, podem contribuir para uma série de problemas, incluindo dependência de drogas e álcool, depressão e ansiedade e até doenças cardiovasculares”, alerta Lenz. “Os mastócitos também podem servir como um alvo viável para desenvolvimento de drogas profiláticas que ajudem a prevenir esses distúrbios psicológicos em crianças que experimentam esses eventos traumáticos”, completa Angela Saulsbery, uma das autoras do estudo e pesquisadora da Universidade de Ohio.
Christian Muller, médico neuropediatra do Hospital da Criança José Alencar e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria do Distrito Federal, explica que o fenômeno é chamado, entre especialistas, de estresse tóxico. Pesquisas mostram o efeito negativo dele, com alteração hormonal e consequências no desenvolvimento infantil. O desafio, agora, é entender mais claramente como se dão essas relações. “Elas estão, por exemplo, em fatores químicos ou estruturais. O fato de não entendermos completamente onde estão não quer dizer que elas não existam. Naturalmente, mais pesquisas são necessárias para elucidar melhor esses caminhos”, disse.
Apoio científico - Thiago Blanco, professor da Faculdade de Medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS), de Brasília, e psiquiatra da infância e da adolescência, acredita que o estudo aborda um tema extremamente interessante e que entra em sintonia com dados observados na clínica médica. “O estresse na infância é um tema já discutido, mas esse estudo se destaca por analisar seu impacto desde cedo. É feito com animais, mas isso ocorre porque não é possível realizar essa atividade com humanos. Se compararmos com o que vemos em pacientes, casos de crianças que foram indesejadas, tentativas de aborto, tudo isso significa que uma rejeição primária realmente gera efeitos negativos ao longo da vida”, explicou.
Blanco destaca que pesquisas como a americana são importantes porque servem como um apoio para profissionais que tratam a saúde mental durante a infância e a adolescência. “Esses dados dão um embasamento teórico mais robusto, que corrobora o que analisamos na clínica. Com essas evidências, temos um arsenal maior para justificar as ações no tratamento. Acho que falamos muito da gestante, mas temos que analisar todo o pré-natal, a questão dos primeiros dias do bebê e como ele pode ser influenciado nesse momento, aumentar o olhar para a saúde mental e entender melhor como ela se desenvolve”, defende.
Durante o encontro da Sociedade de Neurociência, pesquisadores mostraram outros estudos que reforçam o quanto o estresse durante o desenvolvimento fetal ou na primeira infância pode ter consequências a longo prazo. (A.N.)

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