Crítica de cinema - Telas dentro da tela
*Edgar Vianna de Andrade 24/09/2018 18:55 - Atualizado em 27/09/2018 16:04
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(Buscando...) —
Não é simples traduzir uma linguagem em outra. Transformar um romance em peça teatral ou em quadrinhos implica o risco da perda e do fracasso. De fato, os quadrinhos sempre reduzem a complexidade de um romance de Machado de Assis ou de Tolstói. O cinema tem feito essa experiência com fracassos e êxitos. Quase todos os filmes tomam a literatura como base para roteiros adaptados. A maioria dos filmes fica aquém do original. Alguns ficam até além, sobretudo quando a narrativa básica não é boa. Pouquíssimos se equiparam ao livro, como no caso das adaptações de Visconti.
Outra questão pertinente é a do talento de jovens cineastas. Alguns começam revelando criatividade excelente, como Neill Blomkamp, que foi uma revelação com “Distrito 9” e se perdeu com “Chappie”. Ou Darren Aronofsky, que começou muito bem com “Pi”, em 1998, mas acabou tragado por Hollywood. Mesmo assim, ele conservou seu traço autoral nos seus filmes pouco apreciados pelo grande público. São muitos os exemplos. É também o caso de John Krasinski, com uma filmografia mínima e com “Um lugar silencioso”, grande filme de ficção científica. Não convém ir adiante.
Saúdo mais um desses diretores. Seu nome é Aneesh Chaganty, que fez apenas alguns curtas e estreia com seu primeiro longa “Buscando...”. O elenco é pequeno e pouco conhecido. No filme, a linguagem das redes sociais invade a linguagem do cinema. A tela convencional desaparece para dar lugar a imagens e legendas do Facebook e dos celulares.
Usar novas linguagens, porém, não basta. Robert Zemeckis usou a linguagem de captura de imagens em “Beowulf “, filme que não se tornou clássico. O mesmo aconteceu com “O homem duplo”, de Richard Linklater. A gente não ouve falar deles como marcos do cinema. Conclusão: não basta a imagem em filmes inovadores. O roteiro continua sendo fundamental.
Pois a combinação de um bom roteiro com inovação na narrativa é o segredo de “Buscando...”. As imagens e as legendas das redes sociais mostram uma família média americana feliz, digamos assim. No entanto, a mãe morre. A família fica reduzida a uma filha aparentemente bem comportada com um pai cuidadoso. Ela, porém, acaba desaparecendo. O pai e a polícia acabam por considerá-la desparecida. As investigações de uma detetive policial concluem pela morte dela.
Inconformado, o pai continua a investigação e descobre o mistério da filha. O mérito está em criar um clima de suspense sem recorrer à violência sangrenta e a cenas de sexo. Por imagens, palavras e figuras, o diretor cria uma narrativa visual de filme policial e dos bons. “Buscando...” é um excelente exemplo de filme que aproveita o que está ocorrendo ao nosso lado atualmente: a complexidade das redes sociais e o perigo que elas representam para jovens e idosos. O curioso é, porém, não poder explorar esse veio o tempo todo. Não vejo como substituir a linguagem cinematográfica dos nossos dias pela linguagem da internet. Torço para que Aneesh Chaganty não seja cooptado pelo cinema comercial.

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