A indiscutível a indicação do filme “Hereditário” como a melhor opção da programação dos cinemas de Campos, nesta semana, que se inicia nesta quinta-feira (21).
De acordo com a crítica, é difícil expressar tamanha surpresa diante de um filme como “Hereditário”. Dentro de um gênero desgastado como o terror sobrenatural, este projeto comprova que ainda é possível ser profundamente original, combinando elementos típicos com grande pretensão visual e narrativa. Os críticos norte-americanos correram para compará-lo com “O Exorcista” e “O Iluminado”, embora a aproximação não tenha muito sentido — são filmes totalmente diferentes. Ela serve, no entanto, para ressaltar a vontade da crítica de destacar o grande impacto desta obra, e o pressentimento de que “Hereditário” pode marcar uma época, servir de referência, tornar-se um clássico.
Para explicar o que faz do projeto de Ari Aster algo tão diferente da média, vamos por partes, ou melhor, por tópicos. Fuga dos clichês. Esse elemento não é suficiente para que se considere um filme excelente, mas dentro do terror, é indispensável para se sobressair. Não espere jump scares — os tradicionais sustos com seres malignos pulando em frente à câmera e a trilha sonora aumentando o volume para potencializar o impacto. A música não antecipa as ações, não há monstros propriamente ditos, nada de efeitos visuais fáceis. Os “vilões”, caso existam, são apenas os membros da família Graham, constantes vítimas de doenças mentais há gerações, reagindo à morte da matriarca. Ou seja, não existe uma “entidade maligna” vinda de parte alguma como um recurso narrativo fácil, apenas a manifestação extrema de uma dor universal, e passível de identificação com qualquer um.
A reinterpretação do sobrenatural. O núcleo familiar desta história é liderado por Annie (Toni Collette), mulher cuja mãe, filha e pai sofrem ou sofreram de distúrbios psicológicos graves, e por Steve (Gabriel Byrne), homem equilibrado, simples, quase apático. À medida que fenômenos estranhos acontecem ao redor da família, Annie encontra indícios de que possam ser manifestações psicológicas, mas prefere acreditar na leitura paranormal. Steve, por sua vez, encontra cada vez mais indícios sobrenaturais, mas mantém suas crenças científicas e céticas. Eles representam duas maneiras opostas de ler as mesmas imagens, algo que persiste em todo o filme: as perturbadoras cenas de “Hereditário” podem ser a “prova” de uma manifestação sobre-humana, ou a simples metáfora de uma mente perturbada e afetada pelo luto. O filme não possui uma única verdade: ele se oferece como projeto ambíguo, passível de discussão de acordo com as crenças do espectador. Neste sentido, respeita a inteligência do público.
O poder da sugestão. Algo que o projeto compreende brilhantemente é a importância de apelar para o imaginário de atrocidades que toda a pessoa possui em si. A cada cena assustadora — sempre metafórica, poética, próxima do pesadelo — outra é apenas sugerida em metáforas ou diálogos. Depois de nos posicionar junto da protagonista Annie, somos levados a questionar seus atos passados, e também a veracidade de seu ponto de vista. Ela estaria ficando louca? Sua visão de mundo é confiável? As confissões em um grupo de ajuda e as conversas com a amiga Joan (Ann Dowd) atingem um tom de perversidade muito mais forte do que teriam caso fossem mostradas. Ari Aster compreende algo que franquias como “Jogos Mortais” nunca entenderam: se você mostra demais, e repete morte após morte, o resultado é a anestesia do espectador. As diversas cenas de morte em “Hereditário” plantam dúvidas, mesmo diante da prova em imagens. Vale a conferida.
Continuam em exibição “Gnomeu e Julieta: O Mistério do Jardim”, “Jurassic World: Reino Ameaçado”, “Deadpool 2”, “O Processo”, “Não Se Aceitam Devoluções”, “Oito Mulheres e Um Segredo” e “Do Jeito que Elas Querem”. (A.N.) (C.C.F.)