Suzy Monteiro
26/05/2018 18:30 - Atualizado em 28/05/2018 16:56
O que era para ser um instrumento que garantisse tranquilidade acabou tornando-se uma preocupação extra para quem contribuiu em grande parte da vida para o serviço público municipal ou para aqueles que enfrentam um momento conturbado de doença. O Instituto de Previdência dos Servidores do Município de Campos dos Goytacazes (PreviCampos) enfrenta uma de suas maiores crises. Em 2016, de acordo com levantamento da Prefeitura de Campos, teve seu patrimônio reduzido de R$ 1,3 bilhão para R$ 800 milhões por investimentos indevidos. Atualmente, consegue arcar com seus compromissos graças a repasse mensal de R$ 14 milhões feito pelo governo municipal. “Sem esse repasse, não teria como garantir normalmente o pagamento dos aposentados e pensionistas”, informou a secretária municipal da Transparência e Controle, Marcilene Daflon, durante audiência na Câmara dos Vereadores, na última semana. E, mês passado, a PreviCampos foi alvo da operação Encilhamento, desencadeada pela Justiça Federal de São Paulo e pela Polícia Federal em 28 municípios. O PreviCampos é citado em relatório de 22 de novembro de 2017 da Delegacia de Repressão à Corrupção e Crimes Financeiros como “RPPs (Regime Próprio de Previdência Social) com fortes suspeitas de fraudes”.
O relatório, encaminhado à 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, faz parte do inquérito 004/2017, que investiga “grupos formados por empresários e servidores públicos de todo o país com o intuito de praticar diversas condutas delituosas tendentes a fraudar investidores e institutos pertencentes aos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS)”. No documento, onde estão solicitadas medidas cautelares contra os investigados e que resultaram na operação Encilhamento, os delegados Ricardo Ruiz Silva e Melissa Maximino Pastor listam as suspeitas de irregularidades em vários municípios e Campos é apontado entre “os principais RPP’s suspeitos de fraudes”.
De acordo com os delegados, as investigações surgiram após uma instituição denunciar que estariam sendo emitidas debêntures de empresas “laranjas” sem o devido lastro (“títulos podres”) para futura aquisição por fundos de investimento diversos, causando prejuízos milionários a investidores. A suposta fraude envolvendo RPP’s teria movimentado mais de uma “centena de bilhão de reais”, de acordo com o relatório.
Especificamente sobre Campos, a suspeita se deu em virtude de investimentos de cerca de R$ 265,5 milhões realizados nos fundos Illuminati, Tower Bridge, TMJ e Sculptor. Através de informações contidas no Relatório de Auditoria Direta, realizada por auditor fiscal da Receita Federal verificou-se que o RPPS aplicou R$ 40 milhões no fundo Tower Bridge, com autorização do Conselho Deliberativo, mas sem apresentação de relatórios produzidos pelo Comitê de Investimentos, nem justificativa da opção por esse ativo.
Com relação ao Illuminati, o RPPS, somente no período de 15 de setembro de 2016 a 10 de outubro de 2016, aplicou R$ 60 milhões, sendo R$ 20 milhões no dia 15 de setembro de 2016, R$ 15 milhões no dia 30 de setembro de 2016 e R$ 25 milhões no dia 10 de outubro de 2016. A auditoria realizada apontou que na documentação encaminhada havia evidência de aprovação, pelo Conselho Deliberativo (ata de 06 de setembro de 2016), apenas da aplicação no valor de R$ 16 milhões. De acordo com as investigações, o Fundo Illuminati é destinado exclusivamente a investidores qualificados e o PreviCampos “no momento da aplicação, não detinha essa condição”.
Também foi realizado investimento de R$ 60 milhões no Fundo Sculptor, sendo R$ 24 milhões em 14 de setembro de 2016, R$ 16 milhões em 16 de setembro de 2016, R$ 15 milhões em 29 de setembro de 2016 e R$ 5 milhões em 03 de outubro de 2016. De acordo com a PF, o RPPS não encaminhou documentação (ata ou relatório assinados pelo Comitê) que comprovasse a análise da aplicação pelo Comitê de Investimentos, salvo com relação a primeira aplicação de R$ 24 milhões, contudo a Autorização de Aplicação e Resgate não foi enviada.
O Sindicato dos Professores e Servidores Públicos Municipais (Siprosep) informou que está ciente das investigações em curso e espera apuração exemplar: “Se houve alguma irregularidade, os responsáveis devem ser punidos com rigor, pois o servidor não pode, em hipótese alguma, ser prejudicado, seja por má gestão ou desvio de conduta de quem quer que seja”, informou o órgão em nota.
Debate - Na próxima terça-feira (29), às 14h, na sede da Prefeitura, acontece a 1ª reunião do Conselho de Combate à Corrupção, sancionado pelo prefeito Rafael Diniz ano passado. O tema será PreviCampos.
Prefeitura repassa R$ 14 milhões por mês
A Prefeitura de Campos confirmou, através de nota, a situação do PreviCampos. Mas afirmou que, sob a gestão do prefeito Rafael Diniz, instituto contratou a Fundação Instituto de Administração (FIA) — entidade notoriamente conhecida na Administração Pública e Privada Brasileira, criada há 38 anos e mantida pelos professores da Faculdade de Administração da Universidade de São Paulo (USP) — para, com base na análise preliminar apontado nas auditorias realizadas, aprofundar o diagnóstico existente, elaborar medidas técnicas necessárias e desenvolver soluções que permitam garantir a sustentabilidade do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) a longo prazo.
Hoje, de acordo com a Prefeitura, o PreviCampos já capacitou o Conselho Deliberativo e o Comitê de Investimentos para a certificação CPA 10 para que possam atuar de forma crítica, embasada e decisória nos investimentos futuros, dando total transparência fiscal e patrimonial ao servidor e acompanhando todos os investimentos de forma próxima e participando ativamente das Assembleias de Cotistas.
Mensalmente, é feito repasse ao instituto de quase R$ 14 milhões sendo cerca de R$ 10 milhões ao sistema previdenciário — patronal e contribuição previdenciária dos servidores da ativa — e o restante relativo a pagamento de parcelas de dívidas da Prefeitura com o instituto. Sem esse repasse, o pagamento de aposentados e pensionistas estaria comprometido, diz a nota.
Quatro resgates com previsão para 2021
De acordo com levantamento da atual gestão, entre agosto e novembro do último ano de mandato da ex-prefeita Rosinha Garotinho (Patri), o PreviCampos fez oito operações de investimentos no valor total aproximado de R$ 400 milhões. Apesar da crise, quatro ações têm previsão de resgate a longo prazo, a partir de 2021.
Em 2016, o Instituto repassou R$ 279.138.840,11 à Prefeitura com inconsistência nos cálculos. Além de R$ 103.269.707,73 repassados sem justificativa.
Também em abril, a jornalista Berenice Seara, do jornal Extra, afirmou que, logo após as eleições de 2016, R$ 17 milhões teriam sido destinados ao Marte Fornecedores FIDC Sênior, operador do Grupo Seta Atacadista — que fechou as portas poucos meses após o investimento.
Já no apagar das luzes de seu governo, em dezembro de 2016, Rosinha chegou a enviar para Câmara de Campos projeto autorizando a alienação de imóveis públicos para a quitação de dívidas com o Previcampos. Após muita polêmica com os vereadores, ela retirou o processo de pauta. A ex-prefeita sempre negou qualquer irregularidade.