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Integrantes do MST bloquearam BR 356, Campos/SJB, em ato contra prisão
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Ex-governador de São Paulo, Alckmin escapou da Lava Jato e foi para a Eleitoral
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Ex-presidente Lula está preso na sede da Polícia Federal desde sábado passado
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Ministra do STF deu voto considerado decisivo no julgamento do HC de Lula
É possível que a prisão do ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha sido fruto de um conluio da Justiça? Para acreditar nisso, é preciso também crer que 15 magistrados de quatro instâncias do Judiciário brasileiro tenham participado de um “golpe” para prender o maior líder popular do país, desde o também ex-presidente Getúlio Vargas (1882/1954).
Em 12 de julho de 2017, o juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba condenou Lula a nove anos e meio de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso do triplex do Guarujá. Em 24 de janeiro deste ano, os três desembargadores da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) confirmaram a condenação por unanimidade, mas aumentaram a pena para 12 anos e um mês de prisão.
Em 6 de março, em outra decisão unânime, os cinco ministros da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negaram o Habeas Corpus (HC) preventivo ao líder petista. E, na longa sessão encerrada só na madrugada do último dia 5 de abril, o mesmo pedido de HC foi novamente rejeitado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por 6 votos a 5.
Assim, a culpabilidade e possibilidade de prisão de Lula foram determinadas não só pelo juiz Sérgio Moro, mas também pelos desembargadores Leandro Paulsen, João Pedro Gebran Neto e Victor Luiz dos Santos Laus. E não viram nisso nenhuma ilegalidade ou abuso de autoridade os ministros do STJ Felix Fischer, Jorge Mussi, Reynaldo Soares da Fonseca, Marcelo Navarro e Joel Ilan. Assim como os ministros do STF Luiz Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber e Carmen Lúcia. Contrários, ficaram Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello.
Entre votos e votantes da mais alta Corte do país, dois interessantes contrastes: 1) dos seis ministros que negaram o HC, cinco foram indicados nos governos Lula e Dilma Rousseff; 2) pelo conjunto das suas decisões anteriores, estão, entre estes seis, alguns dos membros mais progressistas do STF, como Fachin, Barroso e Carmen.
Curiosamente, os ministros mais conservadores do Supremo jogaram para a torcida da esquerda brasileira. Entre os cinco, destaque positivo — e talvez único — para o decano Celso de Mello. Se pareceu prolixo ao telespectador leigo, ele deu o devido recado aos “pretorianos” (truculenta guarda imperial da Roma Antiga) simbolizados na manifestação pública do comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas. Ele tuitou à véspera do julgamento: “Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”.
A manifestação do general era evitável. Sobretudo no momento em que “bolsominions” lembram a advertência do marechal Castello Branco (1897/1967), primeiro presidente da nossa última ditadura militar (1964/85): “os mesmos que, como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bolir com os granadeiros e provocar extravagâncias do Poder Militar”. Todavia, a preocupação civil era relevante: se Lula conseguisse o HC, após ser condenado em segunda instância, abriria o caminho a todos os políticos e empresários presos por corrupção na Lava Jato.
O fato é que, no mesmo dia 5 em cuja madrugada o STF negou o HC, o TRF-4 autorizou a prisão de Lula às 17h31, cuja ordem foi expedida por Moro às 17h53, apenas 22 minutos depois. Com prazo para se entregar à Superintendência da Polícia Federal (PF) de Curitiba até às 17h do dia 6, a defesa do ex-presidente ainda tentou dois últimos tiros. Mas o novo pedido de HC foi rejeitado por Felix Fischer, relator da Lava Jato no STJ, na tarde do dia 6. A negativa foi bisada na manhã do dia 7, por Edson Fachin, relator da Java Jato no STF e último ministro indicado por Dilma, em 2015 — questionado, à época, por ter pedido voto para ela na campanha presidencial de 2010.
Depois da dupla negativa monocrática, confirmando as decisões colegiadas das duas Cortes superiores, Lula sairia andando do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo (SP) — sua manjedoura como líder político nas décadas de 70 e 80 do século passado — para se entregar às 18h40 do dia seguinte (7). E, por volta das 22h, chegou no avião da PF à capital do Paraná.
Na extensão da sua entrega além do prazo fixado por Moro, o ex-presidente jogou um jogo perigoso, que poderia resultar em sua prisão preventiva por descumprimento de decisão judicial e ameaça à ordem pública. A advertência à possiblidade foi publicamente feita por seu próprio advogado, José Roberto Batochio. E se confirmava desde as agressões, no dia 5, de militantes da CUT a equipes de reportagem do Correio Braziliense e do SBT, na capital federal.
No mesmo dia 5, após chamar o líder petista de “ladrão”, o administrador de empresas Carlos Alberto Bettoni foi agredido e jogado de cabeça contra um caminhão em movimento, diante do Instituto Lula, em São Paulo. Internado com traumatismo craniano até o dia de ontem, a Polícia Civil indiciou pela agressão Manoel Eduardo Marinho, o “Maninho”, vereador petista em Diadema (SP) por cinco mandatos; seu filho Manuel Eduardo Marinho e o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, Paulo Caires. Os três foram identificados por filmagens de celular.
Já no dia 6, também filmados, foi a vez de vândalos vestidos de vermelho atacarem e picharem o prédio em Belo Horizonte onde a presidente do STF, Carmen Lúcia, tem um apartamento. Foi ela quem deu o voto de Minerva para negar o HC de Lula no dia anterior. O MST assumiu participação no ato, não no vandalismo, enquanto no mesmo dia 6 promovia o fechamento de estradas em 40 pontos do país. Mesmo com uma militante ferida a tiro por um motorista, na Paraíba, o movimento fecharia a BR 356 no trecho Campos/Atafona, na última quarta (11).
Noves fora a manifestação da militância orgânica de um PT enfraquecido e partidos aliados de esquerda, além dos satélites CUT, MST, MTST e UNE, a verdade é que a população não se mobilizou com a prisão de Lula, que hoje completa oito dias. De maneira análoga, a mesma imprensa internacional que foi simpática a Dilma, quando de seu impeachment em 2016, não tratou com a mesma reverência a prisão de quem foi chamado pelo ex-presidente do EUA Barack Obama, em 2009, de “o cara” e “político mais popular da Terra”.
Referência também aos brasileiros mais esclarecidos, depois que passou a cobrir diariamente os fatos do país com uma competente sucursal local, o jornal espanhol El País resumiu em sua edição do dia 6: “O herói sindical, o presidente mais popular que o Brasil já teve dentro e fora de suas fronteiras, entrará agora na prisão por uma acusação vergonhosa”. No mesmo dia, o jornal francês Le Monde trouxe uma detalhada cronologia da “ascensão e queda” do líder petista, recapitulando sua história como sindicalista, presidente e, mais tarde, investigado e condenado por corrupção na Lava Jato.
Embora os brasileiros não tenham se levantado com a prisão de Lula, a primeira pesquisa feita depois dela aponta um país dividido — como estava desde as eleições presidenciais de 2014. O instituto Ipsos ouviu 1,2 mil pessoas entre 7 e 10 de abril, nas cinco regiões brasileiras. Divulgada ontem (14) pela BBC Brasil, a consulta indicou 50% dos brasileiros são favoráveis à prisão do ex-presidente, enquanto 46% são contrários. Com margem de erro de três pontos percentuais para mais ou menos, é um empate técnico.
Se o petista é culpado para 57% da população — só 32% acham que é inocente —, 69% acham que ele está envolvido de alguma forma nos casos de corrupção investigados pela Lava Jato. Em contrapartida, 73% concordaram que “os poderosos do país querem tirar Lula das eleições”, com apenas 23% contrários à afirmação. Ainda assim, a quase totalidade da população apoia a continuação da Lava Jato: 93% acham que suas investigações precisam prosseguir, “custe o que custar”, enquanto 92% concordaram com a sentença “A Lava Jato deve continuar as investigações até o fim, pois muita gente ainda precisa ser investigada”.
Apesar do apoio quase integral dos brasileiros, para 52% dos entrevistados não é correto afirmar que “a Lava Jato está investigando todos os políticos”. A percepção de que “a Lava Jato está investigando todos os partidos” é de apenas 43% do eleitorado, ao passo que 47% são de opinião contrária. Para sustentar estes números, assim que Geraldo Alckmin (PSDB) renunciou ao governo de São Paulo, no último dia 6, perdendo o foro privilegiado no STJ para se candidatar a presidente, o braço paulista da Lava Jato pediu que seu inquérito, relativo às delações da Odebrecht, fosse encaminhado “com urgência” à primeira instância.
O resultado? No dia 11, a Procuradoria Geral da República (PGR) — através do procurador Luciano Mariz Maia, número dois do órgão — tabelou com a ministra do STJ Nancy Andrighi para livrar Alckmin da Lava Jato. Por intermédio de ambos, o inquérito do tucano foi encaminhado à Justiça Eleitoral paulista, onde será tratado como desvio de caixa dois, sonho de consumo de todos os investigados da Lava Jato. Chamado de “Santo” nas planilhas da Odebrecht, o presidenciável do PSDB recebeu R$ 10,7 milhões da empreiteira nas campanhas de 2010 e 2014 — cerca de cinco vezes o valor de um triplex no Guarujá.
Com a Rede Globo acusada por Lula de tutora da Lava Jato, o jornal que batiza o maior grupo de comunicação brasileiro publicou em editorial do último dia 13: “Há coisas que reforçam a crítica lulopetista de que o alvo da luta contra a corrupção é prioritariamente o PT e Lula. É o caso da transferência da Lava Jato para a Justiça Eleitoral do inquérito sobre o recebimento de dinheiro de caixa 2 da Odebrecht pelo pré-candidato tucano Geraldo Alckmin”.