Edgar Vianna Andrade
12/03/2018 19:01 - Atualizado em 14/03/2018 16:56
(A Maldição da Casa Winchester) - De fato, a viúva do empresário de armamentos William Wirt Winchester passou 38 anos construindo obstinadamente sua casa, 24 horas por dia, até sua morte em 1922. Em estilo Vitoriano, a construção carece de qualquer nexo estrutural, externando o caos do espírito da proprietária. Acredita-se que Sarah, a viúva, vivia atormentada pelos fantasmas dos mortos com as armas produzidas por seu marido. Os ingredientes para um bom filme de terror com caráter político estão disponíveis: uma casa de arquitetura anárquica, uma mulher perseguida pelos espíritos dos alvejados, o fetiche por armas dos Estados Unidos, os assassinatos em série nesse país e o seu belicoso presidente Donald Trump.
Mas seus diretores Michael e Peter Spierig, também roteiristas juntamente com Tom Vaughan, conseguiram desperdiçar os elementos a sua disposição. Apenas um bom diretor e um roteirista aproveitariam muito melhor o material disponível. Para completar, eles convidaram Helen Mirren para desempenhar o papel da viúva assombrada. Por que motivo a oscarizada artista aceitaria representar Sarah Winchester? Acreditar que o papel era bom ou que poderia transformá-lo em bom? Dinheiro? Mirren ganhou o Oscar de melhor atriz com o filme “A rainha”, mas não tem uma filmografia de destaque. Sua carreira é constituída por altos e baixos, embora seja uma boa intérprete. Assim como ela era assombrada politicamente pela morta princesa Diana, aqui ela é verdadeiramente assombrada pelos mortos.
Querendo afastá-la da empresa, da qual detém o controle acionário, os sócios contratam um médico para emitir um laudo acerca da sua incapacidade mental. O confronto de médico e paciente traz à tona a dicotomia natural X sobrenatural, ainda comum depois da revolução iluminista. O Dr. Eric Price (Jason Clarke) tem um passado trágico, mas é um racionalista. Morreu durante três minutos e, ao ressuscitar, de nada se recorda da sua vida post-mortem. Sarah não apenas crê no além como recebe mensagens das almas e com elas conversa.
O filme começa num tom para logo assumir outro. A misteriosa, inacessível e distante Sarah se transforma rapidamente numa mulher acessível e generosa. O médico demora a mudar suas convicções, embora assombrado com muita frequência. E os sustos decorrem mais dos ruídos bruscos que das aparições fantasmagóricas. O filme banaliza o sobrenatural. Recorre a todos os clichês exaustivamente esgotados por outras produções de terror: a casa mal-assombrada, os maus e os bons espíritos, a possessão, o exorcismo e, enfim, a vitória dos vivos sobre os mortos. Talvez melhor falar num acordo entre vivos e mortos para que todos fiquem em paz.
E, como diretores, roteiristas e produtores vivem querendo ganhar dinheiro, nada melhor que uma franquia. Assim, no final do filme, um prego que prende a trava de segurança de um quarto, solta-se sozinha, como a anunciar que o filme pode ter continuação. Se a bilheteria for boa, inicia-se uma franquia. Caso contrário, o prego volta a seu lugar e não se fala mais nisso.