Nova Base Comum Curricular (1)
Vilmar Rangel 18/01/2018 18:03 - Atualizado em 22/01/2018 18:06
Academia Campista de Letras
Academia Campista de Letras / Divulgação
A notícia gera expectativas. O Ministério da Educação (MEC) começa a elaborar as estratégias de implantação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a educação infantil e o ensino fundamental. As diretrizes, que definem a aprendizagem essencial que todos os alunos, tanto na rede pública como particular, devem adquirir na escola, foram homologadas em dezembro e entram em vigor em janeiro de 2019. Coube ao estado do Ceará a missão de auxiliar nesse desafio, credenciado pelo êxito do seu Programa Alfabetização na Idade Certa (Paic), ali implantado há 10 anos, e que reduziu de 32% para 0,7% o número de crianças não alfabetizadas até o final do segundo ano. As estratégias bem sucedidas auxiliaram na construção e revisão dos currículos, material didático e formação de professores. Registre-se também que no modelo cearense a alfabetização se estende até o segundo ano. O restante será realizado com respeito ao contexto local, cabendo aduzir que o modelo cearense criou formas de cooperação entre o estado e os municípios, buscando facilitar a implantação da BNCC e servir de exemplo para o Brasil. Ressalte-se, por outro lado, que essa nova “base” representa mais uma iniciativa de adequação ao ensino básico, após a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1961), uma “atualização” em 1996 no governo Fernando Henrique, o Plano Nacional de Educação de 2001 (já abordando outras instâncias do ensino) e outras iniciativas, entre as quais se destacam as propostas de Darcy Ribeiro no campo do ensino público.
As questões de avanço e de ganhos com tantas atualizações resumem-se numa só pergunta: o que esse novo modelo (BNCC) pode representar numa formação mais humanizada de nossa juventude? Sim, porque a educação de um povo não pode limitar-se ao conhecimento para uso da língua. Preceitos de comportamento que formam o cidadão não devem estar dissociados da alfabetização. É nesse tempo de aprendizado que devem ser incutidas no cérebro infantil e juvenil os princípios basilares que irão embasar o modo de ver e agir dos nossos futuros adultos. Afinal, desde a avassaladora influência da chamada globalização moderna (não aquela primitiva, produzida a partir do século XV com as grandes navegações e descobertas marítimas), que alguns estudiosos opinam como tendo sido consequência da queda do socialismo no leste europeu e na União Soviética, as relações corporativas, governamentais e pessoais sofreram avassaladora mudança. Expandiram-se os limites da aldeia global, via surgimento de blocos econômicos, economia de mercado, neoliberalismo e modelos afins... A juventude teria sido a quadra de vida que mais se viu envolvida com os novos modos de ver e sentir, gerados por essa “nova ordem”. Muitos desses hábitos “importados” foram então incorporados aos costumes dos países mais abertos a tantas mudanças.
A essa altura de nossa modesta abordagem, cumpre recordar o que disciplinas como Educação Moral e Cívica (fruto do Decreto-Lei 869/1969) e OSPB (Organização Social e Política do Brasil), além de EPB (Estudos de Problemas Brasileiros) produziram de positivo na formação e no comportamento da juventude dos anos 1960 e 1970 (basicamente no antigo curso ginasial), a despeito de terem sido geradas em pleno regime militar. Em sua obra educativa “Educação Moral e Cívica”, de 1971, o Prof. Ebenezer Soares Ferreira, pastor e professor batista, com fortes laços em nossa terra, (foi inclusive presidente da Academia Pedralva Letras e Artes) já levantava uma justificada preocupação com a aplicação, por professores, dos conceitos da referida disciplina. Reconhecendo que o ensinamento deveria ter sido implantado antes de 1969, opinou no prefácio que “o descaminhamento de grande parte de nossa juventude se deve ao fato de não lhe terem sido propiciadas as lições de Moral e Civismo”. Democrata convicto, expressava logo a seguir um receio, qual seja o de que se as lições propostas pela disciplina “fossem ministradas por professores com tendências antidemocráticas, poderão servir-lhes ao seus interesses”. O receio do mestre confirmou-se em parte, pois enquanto os da geração do autor deste texto atravessaram os anos duros do regime militar sem abdicar de suas convicções democráticas, ainda que absorvendo as lições daquela disciplina (fundamentais, sim, para suas formações), há registros de que a mesma foi, nos anos 1970, adaptada para servir, apenas, a “conceitos” de Segurança Nacional...Com isso, muitos conteúdos formadores da moral, do caráter, da ética, da personalidade do cidadão prestante e respeitador dos direitos, foram se dispersando. Mais que isso, não mais se acham incorporados às práticas dos graus fundamental e médio.
O jovem “formado” em numerosas instituições educacionais de hoje (espero que não esteja exagerando e ressalto exceções) desconhece normas ou mandamentos comportamentais respeitosos. São sequestrados pelas chamadas redes sociais, onde predominam futilidades e fake news e onde quase nada se “posta” de forma positiva para realçar os valores de uma cidadania íntegra e colaborativa. O volume de notícias sobre desvio de conduta e corrupção sistêmica, em diferentes setores e escalões (não só os da área pública) acabará em breve (caso não se contenha essa avalanche) anestesiando jovens e adultos, de diferentes classes, que verão nesses delitos algo que se incorporou a uma ilusória “normalidade”. Por outro lado, são mantidos à distância de conhecimentos (ainda que breves) relacionados à história de sua terra, lacuna que destruirá toda a preciosa noção de pertencimento à sua terra, seus costumes, sua cultura, seus vultos, seus heróis...
Obs. Na segunda e última parte dessas considerações (edição de 26 de janeiro) serão informadas as proposições que a Academia Campista de Letras recentemente encaminhou a instâncias oficiais, relacionadas è educação e à cultura dos jovens.

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