O lançamento do primeiro carro bicombustível no Brasil aconteceu há 14 anos. De lá para cá, quem usa um possante flex passou a ter mais autonomia na hora de encher o tanque.
Hoje, os motoristas mais econômicos têm até a equação pronta na cabeça: diz-se que, quando o preço do etanol é até 70% o valor da gasolina, é bom negócio optar pelo produto da cana-de-açúcar.
Mais que isso, e o rendimento elevado da gasolina passa a pesar mais na conta — questão de custo-benefício, claro. Apesar da mudança aliviar o bolso do consumidor, é bom ter em mente que esse é um mal negócio para o planeta.
Pesquisadores brasileiros mostraram, em um novo estudo, que trocar o álcool pelo derivado de petróleo pode aumentar em 30% a concentração de partículas ultrafinas na atmosfera. Os poluentes da categoria levam esse nome por causa de seu tamanho: têm diâmetro inferior a 50 nanômetros (nm).
Os dados foram coletados entre janeiro e maio de 2011, no Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP), zona oeste da capital paulistana.
O período de análise compreendeu uma das crises mais severas que o mercado de combustível enfrentou desde que o álcool caiu no gosto dos brasileiros. À época, uma das causas atribuídas à flutuação dos preços foi o aumento no custo de produção do álcool anidro, composto que é adicionado à gasolina.
Em março de 2011, os preços do etanol batiam recorde em postos por todo o Brasil, sobretudo por causa da alta do açúcar — que diminuía seu uso na produção de combustível.
Com o aumento no preço do álcool, a gasolina começou a ser mais requisitada — situação que o Brasil não estava preparado para administrar. A tão sonhada autossuficiência no setor de combustíveis se tornou um sonho mais distante. Em abril do mesmo ano, a Petrobras aumentou as importações de gasolina para suprir as demandas do mercado nacional.
Essa época de flutuações e troca de cenários se encaixou exatamente na análise dos pesquisadores brasileiros. De acordo com estudo publicado no jornal Nature Communications, nos períodos de uso predominante da gasolina, os cientistas notaram aumento de 30% na quantidade de partículas ultrafinas que os carros paulistanos mandavam para a atmosfera.
O modelo matemático desenvolvido por um dos pesquisadores do estudo ajudou o grupo a considerar também outras variáveis envolvidas no processo, como presença ou ausência de chuva, direção do vento, intensidade do tráfico, níveis de ozônio (O3), de monóxido de carbono (CO) e de outros poluentes.
Dona da maior frota urbana de carros flex do mundo, São Paulo tem 6 milhões de automóveis, praticamente um para cada duas pessoas. Quem mais sofre com essa estatística é a população da metrópole: 11 mil pessoas morrem por ano de problemas respiratórios, graças à má qualidade do ar.
“Essas nanopartículas poluentes são tão pequenas que se comportam como se fossem moléculas de gás. Quando inaladas, elas podem ignorar a defesa do sistema respiratório e atingir os alvéolos dos pulmões. Potencialmente tóxicas, elas podem entrar na corrente sanguínea e aumentar a incidência de problemas respiratórios e cardiovasculares na população”, explicou Paulo Artaxo.
A solução mais plausível, claro, é apostar em alternativas que não se esqueçam do meio ambiente. Além dos biocombustíveis, veículos elétricos ou híbridos também podem ajudar na diminuição dos gases de efeito estufa.
“Ao incentivar os biocombustíveis, resolvemos vários problemas de uma vez”, defende Cartaxo. “Nós freamos as mudanças climáticas, os prejuízos à saúde e estimulamos os fabricantes a pensarem em carros movidos a etanol mais eficientes”, completa. (A.N.)